segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

nº 11 Um poema de Maiclar

Na hemeroteca virtual da Real Academia Galega podemos ler o poema titulado La Aceñera. Está assinada por Maiclar, pseudónimo de Marcial Valladares Núñez. Foi publicado em 1845 na revista La Aurora de Galicia, cabeçalho baixo o qual se agrupavam os integrantes da primeira geração de provincialistas.
Resulta curioso o feito de que este poema não apareça nas obras completas nem noutras monografias sobre o escritor da Estrada publicadas até hoje. Suponho que o facto de ter sido assinada com um pseudónimo deveu fazer que o poema passara desapercebido.
Quando Marcial Valladares publica La Aceñera levava vivendo em Samora apenas oito meses. Vive lá só com seu pai, longe de Galiza e da sua casa petrucial de Vilancosta. Tem saudade, uma morrinha que combate lendo a Lamartine, Mesonero Romanos, tocando o seu violino ou escrevendo ingénuos poemas como o publicado na Aurora. Mas, alem do puramente literário, o texto de Valladares permite-nos fazer um par de reflexões que acho podem ser de interesse.
1. O facto de publicar em La Aurora de Galicia, demonstra que mesmo na distância, Marcial Valladares segue a ter uma boa relação com o círculo da Academia Literária. Entre as assinaturas ilustres do jornal compostelano estão a dos colegas académicos J. M. Posada (fundador do Faro de Vigo), J. M. Gil (homeopata santiaguês) ou o grande poeta Francisco Añón.
2. O poema tem como personagem principal a uma mulher, a azenheira, que canta uma cantiga que espanta ao Valladares. Os ouvidos do polígrafo estradense estavam treinados para a música patrimonial, a qual já se dedicara a recolher na sua aldeia natal quando menos desde 1840. As duas estrofes finais do poema de La Aurora, o momento mas formoso de toda a composição, fala do parecido que encontra o autor entre o canto samorano e outro ouvido por ele a um galego tempo atrás.

Ninfa del Duero, bien haya
quien tal voz y humor te há dado:
tu cantar me há consolado
en mis cuitas y dolor.
Que lo he de aprender te juro
y mas por ser parecido
á uno en Galicia aprendido
del aldeano cantor.

A mi país delicioso
sirena, me has trasportado
dondo otro tiempo he amado
com infantil ilusión.
Donde ofreciera mil veces
el alma la vida entera
cual tu ofreciete, Aceñera,
á los aires tu canción.
Este fragmento pode, de algum modo, insinuar-nos como era o labor etnográfico de Marcial e por extensão, dos pioneiros da recolha etnomusicológica na Galiza. Acho que as mais da vezes o documento aparecia por casualidade, sem ir ao seu encontro e antes de passa-lo a pauta, já na oficina, havia que o reter na memória. Nesse transito tão delicado, a melodia podia sofrer perdas ou modificações, mas também eram melodias escutadas no seu contexto, dum modo natural e não forçado pelo investigador.


La Aceñera

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