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segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

nº 228 Um trisquel e uma cabeça cortada.


Um trisquel e uma cabeça cortada
em Rianxo.

Os meus companheiros de Barahúnda mostraram-me um lugar de extraordinária beleza, as ruínas duma vivenda que guarda toda a magia dos espaços abandonados pelo homem e, em consequência, recuperados pela natureza. Nada mais chegar os meus olhos ficaram fixos numa pedra, mais exactamente o pé-direito duma porta. Sobre ele apreciei a gravura dum trisquel, o primeiro trisquel que eu vi gravado numa rocha do concelho de Rianxo. Levo muitos anos perseguindo as marcas que deixou um ser humano numa época remota e que chega a mim como uma mensagem que devo ler com atenção. E neste caso, sentia-me especialmente feliz porque ia de mãos dadas de Jose e Helena (Barahúnda), dois amigos aos que tantas vezes tenho relatado os meus encontros com os graffiteiros do passado.

O curioso é que muito próximo ao trisquel havia outro achado, nada menos que uma cabeça cortada, semelhante às que já documentara na igreja de São Pedro de Vilas.

Este blogue tem como filosofia documentar aquilo com o que me encontro e só opinar sobre  aspectos dos que considero que tenho algum conhecimento. Não é o caso da matéria que nos ocupa. Eu não posso dizer com certeza de que época histórica são estas peças, se as duas pertencem ao mesmo período, se ambas são reutilizações ou que coisa são... Tenho as minhas opiniões a respeito, mas nunca as publicarei sem contrastar com arqueólogos ou historiadores de arte. O que sim posso assegurar é que estas ruínas tesouram restos arqueológicos duma grande importância e que precisam ser estudadas com urgência, principalmente pelo estado no que se encontra a edificação. Aguardaremos boas novas. 

Trisquel

 Cabeça cortada
(Tal vez uma mocheta ou um modilhão)

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

nº 214 Entre Cruzes. Ranhó. Rianxo.


As últimas postagens serviram-me para achegar uma hipótese sobre a natureza de tantas cruzes como há nos muros rianxeiros, na ideia elementar de que não há uma explicação nem única, nem simples. É muito provável que nunca saibamos a razão de porque alguém decidiu colocar um sinal num pé-direito da sua porta ou numa pedra qualquer de qualquer lugar, pelo que a estas alturas só posso acreditar em que as motivações foram múltiplas, algumas genuínas e outras derivadas. Com isto quero dizer que é muito possível e mesmo provável que alguma vez, ponhamos o caso, alguém colocara na jamba uma cruz onde anteriormente estivesse pendurado o mezuzá, e que outros o imitaram na ideia elementar de que a cruz dá proteção a quem crê nela e a tem presente. 
Um passeio por uma ruela de Ranhó resulta extraordinariamente ilustrativo do que as cruzes representam na paisagem urbana de Rianxo. A rua em questão parece desenhada em função do lavadoiro, uma fonte monumental com rio para lavar ao coberto. A fonte de Ranhó é o polo de atração que faz com que o núcleo urbano se estique como uma ponta de lança.

Google maps

Onde arranca a linha de cor há uma casa belíssima, de muros muito robustos e com um feitio que a singulariza das do seu entorno. Na minha opinião é uma casa barroca, possivelmente do século XVII mas com elementos reutilizados de anteriores construções, algo muito habitual em Rianxo. Num dos muros aparece uma inscrição lindíssima:

Fotografia de Tito Ordóñez.

Resulta impossível de decrifar na sua totalidade, pois parte do texto esta incrustado no próprio muro. Do que se encontra atualmente à vista arriscamo-nos a dizer que a epigrafia está encabeçada pelo anagrama de Cristo IHS [Iesus Hominum Salvator] IYª, sem sentido para mim, ANº [Ano] æ [de] I D...
Muito pertinho desta casa, encontramos outra com um magnífico arco de cortina, s. XV?. Resulta extraordinário que ainda se conserve na sua totalidade, junto com um patamar, igualmente escassos no nosso concelho.


O arco de cortina é muito comprido, lavrado numa soa pedra que forma o lintel da porta. Nalgum momento encurtou-se o vão, acrescentando uma linha de perpianhos na jamba direita, olhando desde fora. Isto leva-me a fazer uma pergunta. Estes perpianhos são os originais movidos para a direita – reenchendo o espaço criado com cachaço– ou se lavraram ex professo para a reforma? Eu acho que são as originais já que se parecem muito às da parte esquerda. Isto resulta da maior importância pois na jamba reformada, no segundo silhar começando desde o arco, encontramo-nos com um interessante graffiti.


Não sei de muitas cruzes em Rianxo marcadas numa cartela. Esta inclusive tem um rebaixe nos cantos do retângulo. Quiçá uma representação da Vera Cruz? Tendo em conta que em Rianxo existia uma capela consagrada a Santa Cruz, agora Ermida da Nossa Senhora de Guadalupe, parece provado que existiu um culto local a este símbolo do cristianismo. Na mesma fachada há outra cruz com uma cartela menos visível por estar mais exposta a erosão. Em realidade são duas, uma acima da outra, que precisariam duma luz rasante para ser vistas com maior claridade. Eu optei por marca-las digitalmente e o resultado pode não ser exato.


Ainda, no mesmo muro, há mais uma cruz, o qual faz desta fachada um caso bem esquisito, somando quatro exemplares e todavia duas com cartelas.


Seguindo a linha marcada no mapa chegamos ao rio com o seu esplêndido lavadouro. Sempre que chego a um lugar assim procuro uma cruz inscrita nalgum lugar: uma pedra isolada, um poste, um muro pertinho... É relativamente habitual encontrar estes símbolos nos lavadouros, como no Rio de Cima, por exemplo. Aqui está num poste ao pé do muro que moldura o lavadouro.


Mas a surpresa estava na fonte ou ainda melhor, na espécie de púlpito constituído pela mureta levantada sobre a abóbeda desta. 


No canto da mureta há uma sequencia de pontos e cruzes verdadeiramente curiosos. 






Os pontos ou covinhas parecem delimitar as cruzes. Entre os signos cristiãs há um que não posso interpretar mas que poderia ser uma marca de canteiro ou propriedade.

                                     

Em resumo, estamos ante uma rua rianxeira de obrigada visita e um exemplo mais das muitas surpresas que podemos encontrar-nos simplesmente com estar um bocadinho atentos nos nossos passeios rianxeiros. 



segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

nº 212 Mezuzah


A gente conhece a minha afeição a observar o que me rodeia com olhos curiosos, reparando em detalhes absolutamente insignificantes que passam desapercebidos do pessoal, quiçá pelo simples facto de sempre estar ai. Assim, fui encontrando marcas, letras, símbolos gravados nos muros de templos, vivendas, valos, etc. Um repertório iconográfico que não para de crescer. 
Às vezes, algo faz que a minha cabeça, sempre fatigada, lembre uma imagem e a associe com uma citação, uma informação lida nalguma parte não sempre evocada imediatamente. A questão é que trás a visita que alguns rianxeiros fizemos ao Castelo da Lua –fortaleça rianxeira na desembocadura do rio Te– convidados por Tito –o concelheiro de património– e guiados por Mario –o arqueólogo diretor das excavações–, volvi a repassar as minhas velhas postagens agrupadas baixo a etiqueta Graffiteiros do Passado. Entre todas elas há uma belíssima, quiçá a mais monumental das que ocupam uma jamba da porta duma vivenda particular, localizada no lugar de A Igreja, Leiro. 

©Orjais

Para entender esta imagem recomendo a leitura dum artigo do Anuario Brigantino titulado Viviendas de judíos y conversos en Galicia y el Norte de Portugal. O seu autor é o arquiteto Emilio Fonseca Moretón e pode ler-se na rede [aqui]. Fonseca Moretón fala-nos das cruzes de conversos, tal e como ele as denomina, uns símbolos que os judeus conversos colocariam justo debaixo de onde estivera colocada a mezuzah. Em realidade, o oco que contém este pergaminho da tradição hebraica seria o que diferenciaria uma casa judia duma cristã:

«El modo de vida judío era en todo parecido al de los cristianos salvo en lo relativo a las prescripciones alimenticias, los usos religiosos, las fiestas, y el día de descanso semanal. No existen por tanto condiciones morfológicas singulares que diferencien la vivienda de un judío de la de un cristiano. Lo que caracterizaba y singularizaba externamente la vivienda de un judío era la mezuzá: una pequeña caja que guarda un rollo o pergamino en el que están escritos unos determinados versículos del Deuteronomio y que debe ser colocada, aproximadamente a la altura del hombro de una persona adulta, en el plano interior de la jamba, con preferencia la del lado derecho, de la puerta de entrada a la vivienda.» Vivendas de judíos y conversos en Galicia y el Norte de Portugal. Emilio Fonseca Moretón. O negrito é meu.

Fonseca Moretón fala neste artigo de algumas outras características das casas de conversos como os arcos em cortina manuelinos, tão abundantes em Rianxo, com dois exemplos magníficos na Rua de Arriba.
Mas voltando à jamba de Leiro vemos como guarda similitude com algum dos exemplos expostos pelo arquiteto Fonseca Moretón. Temos duas cruzes, uma delas monumental, e sobre elas, à altura do ombreiro, um rebaixe que bem podia ser a localização do mezuzah. Normalmente o lugar onde se encaixa o pergaminho kosher é apenas uma tira de aproximadamente 20 cm, pouco mais que a caixa que contem uma caneta-tinteiro. Mas o oco vazio seria um sinal muito evidente de que a casa foi ocupada por judeus, assim que resulta crível que optaram por fazé-lo desaparecer com um rebaixe excessivo para o tamanho da mezuzah. E a cruz monumental? Pois também no artigo que vimos comentando há exemplos similares no que se identifica o desenho desta cruz com um candelabro judaico de sete braços ou menorá. 

 ©Orjais

O feito de pôr cruzes nas jambas das vivendas ou dos moinhos explica-se normalmente por razões profiláticas, como precaução ante os maus espíritos e para livrar a vivenda do mal de olho. Eu tenho visto a várias pessoas passar a mão por estas cruzes e persignar-se. Até não faz muito era frequente as pessoas na Galiza fazer-se cruzes ao sair da casa e mesmo se colocavam pequenos crucifixos de madeira ou porcelana nos pórticos, às vezes mesmo com pequenos depósitos para água benta. 
Com certeza pôde haver casas de conversos que destruíssem os habitáculos da mezuzah e colocaram cruzes nas jambas ou anagramas de Cristo nos linteis, mas, obviamente, não todas as cruzes nas jambas têm que ser necessariamente cruzes de conversos. 

Finalmente, e vendo a impressionante quantidade de cruzes que povoam os muros de Rianxo um tem a suspeita de que não é fruto da casualidade e que o fenómeno merece ser estudado a fundo. A câmara municipal da Guarda, na Beira Alta de Portugal, enviou-me faz uns anos um formoso livro e diverso merchandising sobre as marcas mágico-religiosas da sua vila, em todo similares às de Rianxo, seguindo-se nesta publicação a tese judia. Eu não sei qual é a razão de que existam estas cruzes no nosso concelho nem vou defender a sua origem nos cristãos novos, o que sim sei é que cada vez que penso na relação entre a cultura judaica e Rianxo sempre me vem a cabeça o complexo rupestre da Foxa Velha nas abas do Pilotinho, a pouca distância da Igreja de Leiro. Sobre a grande laje da Foxa Velha e quiçá com um intervalo de alguns milhares de anos, habitantes do que hoje é Rianxo foram deixando a sua pegada em forma de espirais, labirintos, covinhas ou cruzes. E entre tanto desenho de difícil interpretação alguém sentiu a necessidade de gravar uma Estrela de David.

Estrela de David na Foxa Velha, Rianxo.

sexta-feira, 23 de junho de 2017

nº 210 Uma casa no Rianxinho.


Cada vez que vou dar um passeio pela zona alta do Rianxinho, tenho a sensação de que me adentro num burgo medieval em miniatura. Visto desde o ar [fot.1], vê-se um urbanismo compacto que tende a cerrar-se sobre sim mesmo. Em contraste, a zona baixa do bairro está construído linearmente, com ruas de aceso perfeitamente desenhas. Dado que nas proximidades há um petróglifo monumental e um castro, tal vez poderíamos traçar um contínuo habitacional ininterrompido desde épocas remotíssimas até os nossos dias. 
Se caminhades polas ruelas do interior do círculo da fotografia 1, fixáivos nas vivendas, nos muros descomunais das casas, nos diminutos vãos... Ide com os olhos bem abertos e caminhai devagarinho. Com certeza estareis a desfrutar dum dos espaços urbanos mais belos e, ao mesmo tempo, tal vez menos conhecido do nosso concelho.
fig. 1

Como exemplo deste passado medieval gostaria-me destacar uma porta. Pressenta uma única mocheta,  a esquerda, sobre o que descansa um lintel descomunal. E no lintel...

...uma cruz lindíssima. 


E mais uma perto da fechadura.


Nos pé-direitos notam-se as marcas onde encaixariam as trancas e os tarabelos.
Acho que esta vivenda, como outras do Rianxinho, mereceriam o estudo detido de peritos na matéria. Com certeza descobriríriamos grandes tessoiros.

segunda-feira, 22 de maio de 2017

nº 208 Graffiteiros do passado V

V

Fazia tempo que não saia de caminhada polos montes de Rianxo, tanto que achava mais que provável que os grafiteiros se esqueceram de mim. Mas não, sempre há algum regalinho para uns olhos observadores. Desta volta encontrei dois espécímes que ponho ante vós por se fossem de interesse.
O primeiro é uma U, tal vez uma ferradura ou uma inicial. Sendo o seu um contexto de canteiro, tal vez se trate duma marca de pedreiro. De ser uma ferradura não conheço outra similar nas rochas rianxeiras.



A outra resulta-me mais inquietante. Haverá que ir de noite para vê-la com luz artificial, mas acho que na fotografia se intui bem a figura rebaixada na pedra. Desconheço que pode simbolizar e não sei de exemplos similares. Como sempre, qualquer sugestão é bem recebida.




Quando possa ir demoradamente a observar esta rocha, tenho a certeza de que descobrirei novos desenhos e mesmo a perceção que tenho deste pode sofrer modificações, mas, por enquanto, ai ficam as imagens, para que não me esqueça de voltar.

sábado, 1 de setembro de 2012

nº 143 Graffiteiros do passado IV

IV

O Campo das Graneiras de Meiquiz é um lugar extraordinário, não só pelo seu valor etnográfico e estético intrínseco, senão pelo grande potencial que tem como espaço singular para a celebração de eventos ou actividades didácticas relacionadas com o conhecimento das graneiras, as suas variedades e os seus usos.
Desde um espaço amplo, onde devia estar a eira de malhar, podes contemplar os espigueiros, caboços, graneiras, piornos, hórreos, que de todas estas formas, e alguma mais, se lhes denomina, com a curiosidade de que praticamente todos espécimes que contemplamos pertencem a um género de graneira diferente, estando alguns feitos de madeira, outros de pedra, outros mistos, também de tijolo, havendo-os com cepa, com claros... em fim, um parque temático do hórreo galego.
Para mim é uma matéria pendente saber mais deste Campo das Graneiras, e quiçá no curso que começa me aplique com especial atenção. Hoje quero deixar constância no meu blogue dum descobrimento para mim inquietante, como cada vez que me encontro com um destes graffitis do passado, difícil de interpretar, mas tão doado, ao mesmo tempo, de especular sobre o seu significado!
O gravado está sobre uma pedra nos limites do Campo das Graneiras de Meiquiz. A pedra deveu pertencer a uma construção agora desmontada, quiçá um hórreo? De momento nada sei, e tal vez nunca saibamos a sua colocação certa, mas sim podemos desfrutar da sua beleza esquemática e comparti-la por se alguém pudera dar alguma dica a seguir.
Trata-se dum desenho inscrito num quadrado de lados que pretendem ser iguais, duns 30 cm de comprimento. No interior há uma cruz truncada pela parte superior e cujo haste inferior, sempre na direcção da fotografia, está sobre um pedestal em forma de «m». No canto inferior esquerdo há um ponto e no lado direito um arco em forma de com um apêndice no centro semelhante a um mamilo.
Poderíamos qualificar este desenho como uma marca de propriedade ou uma marca de canteiro, mas ambas as duas hipóteses como mera sugestão, pois como digo, careço de qualquer informação adicional.


Por último, sobre tudo a um possível leitor de Ilha de Orjais indígena de Meiquiz ou de Or, qualquer informação sobre a pedra será de agradecer. 

sábado, 4 de junho de 2011

nº 113 Graffiteiros do passado III

III

A ALDEIA VELHA DE ABUIM.

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Desenho de Castelao para o conto
A Aldea esquecida do livro Cousas.

Não gosto nada disso de chamar Aldeia Maldita ao grupo de casas abandonadas em Abuim, uma paragem cheia de beleza e onde há alguma que outra marca da que gostaria de falar um bocadinho. Não gosto de que a uma lenda de grande valor desde o ponto de vista etnográfico, se lhe dê categoria de histórica sem um trabalho prévio de especialistas, duma equipa interdisciplinar que resolva todos os mistérios deste povoado desabitado.
No meio da aldeia, um tem a sensação de que o único que aconteceu é que os vizinhos abandonaram um lugar afundido no terreno, sombrio, para procurar espaços mais elevados, em todo caso a poucos metros de onde viviam com anterioridade. Isto parece que desbotaria a hipótese da peste ou qualquer outra epidémia-maldição, pois essa pouca distância entre a aldeia velha e a nova não os ia proteger muito. Com tudo considero que qualquer hipótese ao respeito é uma arroutada um tanto desnecessária, em quanto que não se fazam estudos sérios bem alicerçados na ciência.
Eu vou documentar algumas coisas interessantes que tenho observado nas minhas visitas ao lugar, sempre com a esperança de que a alguem lhe resultem de utilidade.

No caminho pelo que nos adentramos à aldeia há uma casa restaurada com uma grande portada, cujos pernos estão fixados em dous grandes piares. Um deles tem uma cruz com uma cifra embaixo, quiçá uma data.

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O meu calco

De emprender um estudo sério sobre o lugar, haveria que ter em conta esta pedra, perguntar aos donos a sua origem, se sempre estivo lá ou se foi trazida doutro lugar, etc.

Os Caminhos.

Alguma das imagens mais impactantes da Aldeia Velha de Abuim estão nos seus caminhos, corredoiras com altos muros a cada lado e com os restos das pedras que noutrora forraram o chão.

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Nalgumas destas pedras inclusive podemos apreciar o sulco deixado pelas rodas dos muitos carros de bois ou vacas que transitaram por cima.

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A gente que normalmente visita a Aldeia Velha fica só no primeiro grupo de casas, três exatamente, e na corredoira que baixa em direção ao mar. Porém, se te adentras um bocado nos montes dos arredores, ao norte deste caminho principal irás descobrindo novas sendas ocultas no mato, mas que paga a pena visitar.

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Fica para outro momento falar destes caminhos, quiçá traçar um mapa e fazer também um pequeno comentário da feitura dos muros, bem curiosos.

As marcas.

Também na Aldeia Velha de Abuim há marcas que devemos conhecer e que merecem um lugar nestas postagens. O grupo de casas do que ainda ficam algumas ruínas estão agrupadas ao começo do caminho. Numa delas, no pé direito da porta, percebe-se uma imagem antropomórfica triple, quase como um fractal, que me lembra um cristal de neve. Em qualquer caso, não logrei encontrar um exemplo semelhante a este em todos os repertórios de imagens por mim consultados.

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O meu calco.

Embora, a rocha mais monumental está descendo pelo caminho, a poucos metros da casa. Numa pedra cheia de musgo há gravadas, quando menos, duas cruzes associadas a círculos.

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Fotograma da reportagem A morte negra
emitido no programa Cuarto Milenio da
cadeia televisiva Quatro. Na imagem o
periodista Pemón Bouzas.

Tem de haver alguma técnica de restauração para poder tirar da rocha o musgo sem danar os desenhos que ficam ocultos baixo o manto verde. Nas Cruzes de Pedra de Castelao aparece uma cruz como esta com a anotação de que existe em diferentes lugares. Sabemos que o escritor rianjeiro visitou a Aldeia Velha de Abuim pelo relato titulado A aldeia esquecida do seu livro Cousas.

O FORNO DO MARTELO.


Faz uns dias passeava com a minha nena pelo centro de Rianjo, como tantas outras vezes, quando ao chegar à praça de Dieste reparei no perpianho duma casa. As sombras que provocava um sol já em retirada, fizeram que umas letras muito erodidas tiveram por uns instantes uma visibilidade algo maior. Acheguei-me a pedra e repassei com o meu dedo índice o sulco, onde pude ler claramente uma letra V, um M, um S...

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Surpreende-me muito que não tenha lido nada sobre esta inscrição, quiçá romana? nos muitos livros sobre a história local como há publicados. Suponho que algo haverá por ai, assim que se algum leitor sabe qualquer coisa prego mo comunique.
O engraçado do assunto é que em quanto andava a tirar umas fotos com o telemóvel uma mulher maior que vinha da missa perguntou se era periodista. Suponho que lhe pareceu raro que andara a palpar a pedra duma casa que não semelhava ter nada de anormal. Diz-lhe que não, que eu era um professor do colégio de Taragonha e que andava a dar um passeio com a minha pequena. Também lhe contei que naquela pedra que eu estava a tocar havia letras que deviam ser muito antigas. A senhora disse-me que vivera toda a vida aqui a beira e que nunca reparara. Onde si vira muitas coisas escritas era na igreja, que foram os mouros e contou alguma lenda da qual quando tenha mais dados prometo postar.
Também me contou que aquela casa onde estava a pedra inscrita, fora dos Martelo, os donos do paço da praça de Dieste, atual biblioteca. Os proprietários arrendaram-lha a uma mulher que cozia par fora pão e empadas. Depois, a casa fora vendida ao seu atual proprietário, um homem que segundo ela me diz quis obrar mas não lhe deixaram.
O bom é que além do perpianho com as letras, há alguma coisinha mais. Por suposto não podia faltar uma cruz, um símbolo ao que a minha idosa informante não deu nenhuma importância. Segundo ela pôde ser feito por qualquer um, é dizer, não por um mouro. Também há uma marca muito curiosa, uma cifra, 1647. De ser um ano, a sua localização mais lógica seria um dintel, mas encontra-se na cara interior duma janela, pelo que suponho que se trata duma pedra reutilizada doutra construção.

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IHS

Como é sabido o monograma IHS representa o nome de Cristo. Colocado na torça duma porta adquire uma utilidade múltipla: advir-te que quem mora nessa vivenda e bom Cristiano, tem poderes profilático para os seus moradores, saúda aos passeantes, etc. Também os AVE MARIA servem para todo isto, indo ambas palavras muitas vezes juntas no mesmo letreiro. Isto é o que acontece com as duas seguintes imagens, uma de Leiro e outra do Passo.

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No letreiro do Passo, o A M com toda probabilidade são as iniciais de Ave Maria, mas também poderiam ser as iniciais do dono.
Na ribeira de Rianjo há outra casa com pedras que parecem reutilizadas duma antiga edificação da época renascentista. Quando os vi por primeira vez, pensei que podiam ser restos dum dossel mas agora tenho as coisas muito menos claras. O friso da parede do leste tem a cifra 1593 e o do norte o monograma e a lenda LÍBRANOS DE MAL.




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sexta-feira, 27 de maio de 2011

nº 112 Graffiteiros do passado II

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O moinho do Rio do Mar em o Rial.
O moinho do Rio do Mar, no lugar de O Rial, merece uma visita por muitos motivos. Em primeiro lugar, e quiçá o mais importante, porque o conjunto formado pelo moinho e a ponte que está ao seu carão e simplesmente belíssimo.

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A primeira notícia que teve da singularidade desta edificação foi por um artigo publicado em 1981 titulado Dous grabados de embarcacións nun muiño de Rial BRIGANTIUM. Boletín do Museo Arqueolóxico e Histórico da Coruña nº 2 da autoria do professor corunhês Fernando Alonso Romero. Dito artigo é muito breve e tão só avisa da existência duns desenhos na porta do velho moinho do Rial. Também achega um calco dos mesmos, isolados de outras marcas interessantes, como são algumas cruzes feitas com a mesma técnica de incisão que os barcos.
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Fernando Alonso Romero diz, acho que dum modo puramente intuitivo, que quiçá se trate da estilização dum daqueles barcos dos que noutros tempos podiam avistar-se desde a baía do Rio do Mar.
Já disse que esta série de artigos só procura documentar, nunca teorizar, sobre marcas que não foram apenas estudadas com anterioridade e que merecem ser objeto da atenção de pessoas mais sabidas do que eu. Mas não me podo resistir a amostrar-vos algumas imagens verdadeiramente surpreendentes. Quando vi estes desenhos do moinho do Rio do Mar lembrei de imediato as conhecidas como "siglas poveiras" definidas como "uma forma de proto-escritura primitiva, já que se trata de um sistema de comunicação visual rudimentar; [que] eram usadas como brasão ou assinatura familiar para assinalar os seus pertences". fonte
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Siglas poveiras fonte
Em Portugal disse que a origem destas marcas estaria nas invasões vikingas das nossas costas, mas o interessante é o caráter marítimo das mesmas. Outra referência a ter em conta encontrá-la-iamos nos muros da fortaleça de Brouage, na França. Nas Actas del V coloquio internacional de gliptografia, II Vol. Ponte Vedra, Julio de 1986, podemos ler um artigo fascinante: Les graffiti des remparts de Brouage. (Charente-Maritime-France). p. 539-563. Como uma imagem vale mais que mil palavras, eis uma ilustração do artigo.
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Como se aprecia nos mastros e velas dos barcos têm certas analogias com Rio do Mar. Na ilustração de Brouage, vemos, na parte superior, uma linha de cruzes que estariam disseminadas pelos mesmos muros que os barcos. Pois bem, na porta do moinho do Rial há também cruzes como esta:

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Remarcado digital

A porta do moinho está muito deteriorada sendo uma autêntica milagre que sobrevivera até hoje. Acho que uma medida oportuna seria a de que o concelho negociara com os proprietários a cessão da dita porta a câmbio doutra nova, para ser conservada no Museu do Mar. Se não se tomam medidas urgentes, qualquer dia ficamos sem ela.
No dintel do moinho podemos ver uma inscrição em pedra que diz:


ME HIZO D.N BALTASAR BLANCO.
EN EL AÑO DE 1832.

Na agulha esquerda da porta há uns gravados nos que se aprecia claramente uma cruz e uma letra P, mas pode haver alguma outra inscrição hoje muito erodida.
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Um dado muito bom que nos achega Fernando Alonso Romero é a hipótese de que a pintura da porta, e quiçá também das paredes, esteja feita a base de casca de pinheiro, a mesma que se usava quando eu era criança para encascar as redes. Acho que esta técnica de tingir abandonou-se com a chegada dos aparelhos de fio sintético. Alguma vez tenho lido que também os hábitos franciscanos se tingiam a sua vez empoçando o pano neste líquido.
A passadeira ou pontezinha ao pé do moinho é uma delicada obra de cantaria onde a lógica é o conhecimento do médio resultam evidentes. Os piares têm a forma arredondada por um extremo, o que se enfrenta a corrente e quadrada pelo outro. Com isto conseguem que haja uma menor resistência ao rio e, ainda mais, uma menor acumulação da ramada arrastra pela água.
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Em previsão das cheias, as lousas dos peitoris, têm um buracos quadrados por onde escorrer a água.

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A CASOTA DE LEIRO
O meu amigo Carlos Collazo levou-me até uma casota das utilizadas pelos marinheiros para guardar os seus aparelhos e demais utensílios do ofício. Está na praia de Leiro e é uma edificação de blocos de concreto sem qualquer interesse mais que o anedótico de ter-se encontrado no seu interior nada menos que o Casco de Leiro.
Na mesma linha de praia onde se levantou esta casota há muitas outras feitas de tijolo ou com os surrealistas bombos de bateia.
Mas ao par de todas elas há uma singularíssima que guarda inúmeros gravados, os quais deveram ser visitados quanto antes pela comunidade científica.
Sobre o dintel há um símbolo que poderia ser uma marca de propriedade, quiçá o emblema da família dona da casa.
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Nos muros encontramos gravuras de difícil interpretação. Há, por exemplo, uma cifra, 1823 ou 1828, que imediatamente sugere um ano, uma data, mas quem sabe...
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Também podemos encontrar iniciais e algum outro risco pouco claro. Mas de entre todos os que nos identificamos há dois que chamaram especialmente a minha atenção. Em primeiro lugar uma pedra do muro norte, um pequeno rebo quase triangular com duas covinhas como orbitas duma cara sem olhos. Quando a vi por primeira vez fiquei um instantinho a olhar para ela, e mesmo que a foto não lhe faz muita justiça, certamente logrou, por algum motivo que desconheço, seduzir-me.
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A outra é um perpianho que contem uns riscos que me fizeram dar-lhe muitas voltas a cabeça pensando na sua possível origem.

Separados por uma diaclase vemos no lado esquerdo um grupo de letras onde se lê claramente F A I. No lado direito, ao lado duns riscos e pontos nada claros, uma figura antropomorfa esquemática.
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Disimulem o meu vandalismo ao pintar com grafito preto os riscos, mas quando comecei a traçar não contava com encontrar coisa de tanto interesse. Sinto-o.
Continuaremos...