sábado, 6 de maio de 2023

nº 254 Ninguém se lembra do segundo!

Ninguém se lembra do segundo!

Pequena biografia de Celestino López Sánchez.




Imensamente agradecido a:
Flora Rodríguez, Pepe Pardavila  e Jorge Abal da Póvoa, 
Ramom Pinheiro, Isabel Rei, Xoán Pastor Rodríguez, 
Tamara Dopico, Cantigas e Agarimos e
ao sábio Xosé Comoxo.

Em 28 de junho de 1924, na Praça da Quintana ou dos Literatos, realizou-se o concurso de gaita-de-foles mais famoso da história da Galiza. Nesse dia, Avelino Cachafeiro Bugallo é proclamado, de fato, o melhor gaiteiro do país. Segundo Rivas Troitiño, as obras obrigatórias do concurso foram a Alvorada de Veiga e um passacorredoiras, entendo que de livre escolha. No mesmo artigo afirma que “de los nueve gaiteiros inscritos, tres se retiraron, no sabemos si por temor al ya temido gaiteiro de Soutelo, o por otras razones” [Triunfo. (23 março 1974) Año XXVIII, n. 599, p. 31-33]
Apesar da escassa participação, a vitória alimentou o mito do Gaiteiro de Soutelo, elevado aos altares numa encenação que parecia, e talvez fosse, feita à medida. Dois dias depois da vitória de Avelino, Castelao acompanhou o herói na sua entrada triunfal em Soutelo. Ao chegar à porta de casa, o patriarca do clã, Fermín, acendeu um foguete. Os primeiros a cruzar o umbral foram os irmãos Cachafeiro, e depois Castelao, como Escrivão Geral da galeguidade. Assim, o dia 10 de agosto, o jornal Galicia [Castelao, D. (10 de agosto de 1924). “O Gaiteiro de Soutelo” . Galicia. p. 1] publicou em primeira página uma crónica do político rianxeiro, acompanhada do retrato de Avelino que se tornaria icónico no imaginário da nossa cultura popular [Ver apêndice]. Nela, dá-se conta de que o terceiro prémio foi conquistado polo adolescente Cástor Cachafeiro. De quem não diz o nome é do gaiteiro que teve a honra de estar entre os dois irmãos de Forcarei. Polos jornais da época sabemos que se tratava de Celestino López Sánchez, gaiteiro do coro Cantigas e Agarimos e saxofone barítono do 3.º batalhão de infantaria. Mas, o que sabemos desta personagem que ousou desafiar em cima do palco, o próprio gaiteiro de Soutelo? Aqui estão as minhas descobertas.

No centro, em primeiro plano com gaita, Celestino López.


Asociación de Exploradores de Ponte Vedra

Celestino López Sánchez nasceu em Ponte Vedra em 14 de julho de 1902, sendo os nomes dos seus pais os de Enrique e Josefa. Assim consta no seu atestado de óbito, embora tenha promovido a ideia da sua natureza compostelana.
Quase nada sabemos sobre a primeira década da sua vida, mas em 1912 acontecerá algo que será fundamental na formação musical posterior: o capitão de cavalaria Teodoro Iradier y Herreo funda a Asociación de Exporadores de España, na sequência do recém criado movimento escuteiro. Em dezembro desse mesmo ano nasce a delegação de Ourense e logo, a seguir, a de Ponte Vedra, tendo como presidente o omnipresente Marquês de Riestra. Ao primeiro executivo pertencem personagens conhecidas da vida de Ponte Vedra, como Prudencio Landín, Isidoro Millán ou Javier Pintos. No final desse ano, os exploradores formaram uma Banda de Música dirigida por Juan Serrano Marqués (Lugo, 1859 [conforme atestado de óbito]; 8 de janeiro de 1954). O maestro Serrano, aluno de Montes e Varela Silvari, entre outros, teve uma vasta experiência tanto com grupos infantis (Orfeón infantil de Lugo, Orfeón infantil helénico de Ponte Vedra...) quanto na direção de bandas musicais (Lugo, Ponte Vedra, Vigo...). Há que ter em conta que a Asociación de Exploradores recrutava crianças de entre 12 e 14 anos. Em 1914, o duo formado polo requinto Celestino López e o flautim Alfonso Quintas, acompanhados ao piano polo próprio maestro Serrano, participavam nas quermesses organizadas pola Asociación. Nesses eventos era frequente a presença do Instructor Jefe dos exploradores, o barítono Víctor C. Mercadillo. O bando de exploradores, formado sob o prisma do movimento scout, foi fortemente influenciado pola estética, organização e disciplina militar. Robert Baden-Powell, fundador mundial dos escuteiros, assim como Teodoro Iradier, seu sósia espanhol, eram soldados de carreira. Por mera intuição da minha parte, tendo a pensar que a influência britânica do fundador e a suposta marcialidade das gaitas-de-foles para o desfile, fizeram com que os exploradores se interessassem em incluir este instrumento galego nas suas formações, acompanhando, em muitos casos, tambores e cornetas. Assim, em 1914, podíamos ler num jornal a seguinte nova:

«Se exhibe en un escaparate del Toral, una preciosa gaita gallega de madera clara y guarniciones de terciopelo y seda morado y amarillo, que encargó el comité de exploradores del distrito de Chamberí, en Madrid, al local de Santiago.
Tal instrumento es para la charanga de los exploradores de la Corte, y en el extremo del ronco lleva una artística plancha en mate, en la que, rodeando la estrella de cinco puntas, se lee: “Exploradores madrileños». La Correspondencia Gallega : diario de Pontevedra (6 abril 1914) Ano XXVI n. 7259 p. 1.

Sabemos que nas festas organizadas polos exploradores, Celestino tocava gaita-de-foles, acompanhado ao tambor e ao bombo polos camaradas escuteiros Ribadulla e Pacheco, como aconteceu em maio de 1918 com motivo da celebração do aniversário do Rei.
Celestino acompanhou também um coro escuteiro, precedente mais imediato para aquela que será, anos mais tarde, sua atuação no coro folclórico Cantigas e Agarimos.

«Tanto la banda de los exploradores como el coro de los mismos con su gaita, fueron ovacionadísimos y obsequiados en las Sociedades Casino, Gimnasio y Círculo Mercantil. [Visita à Estrada]» Diario de Pontevedra (6 de agosto de 1918) Ano XXXV n. 10290 p. 1.



Compostela

Em 1919, Celestino recebeu uma pensão de estudos da Fundación Figueroa. Com quase total probabilidade, foi este o motivo que o levou a viver em Compostela. Um ano depois, começam os ensaios de Cantigas e Agarimos, coletivo de que faz parte desde sua fundação. Integrou também a banda do regimento de Zaragoza, tocando o saxofone barítono. Em 1923 casa com Manuela Segade López, celebrando o vínculo na igreja paroquial de San Miguel dos Agros. O padrinho do casamento é o fotógrafo Enrique Guerra, presidente do coral, o que reafirma ainda mais seu vínculo com Cantigas.
Quando conquistou o 2º prémio no concurso de gaita-de-foles das festividades do Apóstolo (1924), foi referido na imprensa como músico de 3.ª da banda do regimento de Zaragoza. Na verdade, em junho já aprovara a oposição para a banda de música municipal, na qual tocará primeiro saxofone barítono e, depois, o contralto. O annus miriabilis de 1924 se encerrará com o nascimento dos gémeos Leonardo e Aurora López Segade. Esta última casará com António Varela Caeiro, colunista da imprensa local e secretário do pósito de Rianxo. Uma carreira profissional muito semelhante, como veremos, à do sogro.
Vale ressaltar que Celestino coincidiu com o maestro Bernardo del Río na banda do regimento de Zaragoza, na banda municipal compostelana e em Cantigas e Agarimos, sendo esta uma pessoa a quem sempre guardou um carinho sincero.

Nesse período estudou magistério, recebendo-se em 1928.

A guitarra e a Agrupación Artística Compostelana

Em 1929 nasce a Asociación Artística Compostelana, sendo Celestino o primeiro regente da sua rondalla. Com efeito, entre os muitos instrumentos que tocava estava a guitarra, como pode ser conferido na notícia a seguir: 


«El director del coro Cántigas e Agarimos y profesor de la Banda Municipal don Celestino López Sánchez ha dado ayer noche en su academia de música ante un público selecto invitado particularmente al acto, un magnífico recital de guitarra, en el que fue muy aplaudido y demostró la sorprendente técnica y dominio que tiene en la ejecución del referido instrumento.
Celestino López Sánchez se propone llevar a cabo por Galicia una tornee artística para darse a conocer como guitarrista notabilísimo que es». El pueblo gallego : rotativo de la mañana. (15 de marzo de 1929). Año VI Número 1581


Era frequente que nos concertos da rondalla, Celestino tocasse algumas peças a solo. À frente da Agrupación Artística é mais do que possível que tenha dirigido, e até formado, a um adolescente Basílio Carril (1914-1974), famoso fabricante de gaitas-de-foles. Dizia-se que ele até construiu sua própria guitarra [Ver entrada da Gran Enciclopedia Gallega assinada por Benedicto García]. A formação de Celestino como guitarrista e rondallista pode ter vindo daquela banda de exploradores pontevedrina. Seu regente, Juan Serrano, também tocava guitarra e bandurra. Se considerarmos que Serrano foi aluno de Montes, mais uma vez, também guitarrista, poderíamos falar de algo semelhante a uma escola. Na realidade, Montes, Serrano e López Sánchez constituem uma cadeia de custódia de uma tradição musical ou prática comum, bandística, orfeonística e guitarrística. Infelizmente, para poder falar nesses termos, falta-nos o fundamental: seu repertório.

Em 1930, Celestino demitiu-se da banda de Santiago para liderar a banda de A Lama.

Professor de primário. A Póvoa do Caraminhal 

Em 1932 começa o ano como professor de educação primária e música da academia compostelana Nieves, mas, apenas dois anos depois, após um período de cursillista, começou a lecionar na escola do pósito da Póvoa do Caraminhal. Na vila nazarena funda a Agrupación Artística Musical y Recreativa Arosa, à semelhança da Agrupación Artística Compostelana. Também iniciou sua estreita relação com as organizações de pescadores, sendo na época do golpe de estado franquista, secretário do pósito.

Agrupación Artística Musical y Recreativa Arosa? ca. 1935
Arq. Xoán Pastór Rodríguez

Agrupación Artística Musical y Recreativa Arosa
El Pueblo gallego (28 -fevereiro-1936 ) Ano XIII, n. 3891, p.3

Como todos os cursillistas da República, ele foi expurgado. Assim, em setembro de 1936, foi suspenso do seu cargo por um ano. No entanto, depois de três meses, ele já tinha voltado para a escola. Em junho de 1937
[BOE, Burgos, 7 de agosto de 1937] foi reintegrado definitivamente no cargo, ordenando-se o pagamento dos salários que lhe eram devidos.
Nos primeiros anos da década de 40, aprovou as oposições de orientação marítima e integrou a junta local de pesca da costa noroeste. Além disso, ocupa o cargo de chefe local do Sindicato Espanhol de Professores (S.E.M.), sindicato vertical franquista.

Presidente da Câmara Municipal da Póvoa do Caraminhal



Por um curto tempo, 1952-1954, ocupou a presidência da Câmara Municipal da Póvoa do Caraminhal. Durante sua gestão, começaram as conversas sobre a valorização turística do entorno de Curota e foi recebido o busto de Valle-Inclán, um presente do concelho de Ponte Vedra, obra do extraordinário artista Benito Prieto Coussent. Em agosto de 1953 é apresentada ao seu público a Agrupación Artística Musical Caramiñas, na qual Celestino dirige o coro.

Juízo a Cantigas e Agarimos
Em 1954, o jornal La Noche, regista uma troca de impressões entre Celestino López e Francisco Rodríguez, então diretor de Cantigas e músico, vice-regente e, posteriormente, regente da Banda Municipal de Santiago de Compostela. Enfrenta-se um membro fundador e regente do coro, com o primeiro maestro após a refundação provocada pola morte de Bernardo del Rio. Este debate resulta interessante em extremo para entender a evolução dos coros galegos.


«El coro Cantigas e Agarimos juzgado por su antiguo director Celestino Sánchez.
[...]
-Opino que dos gaitas están bien en los desfiles y en las foliadas, pero no en otra clase de cantos, en los que me inclino a utilizar una sola, puesto que, además del exceso de sonido, y posible desafinación y la también posible poco unidad entre las mismas, pueden deslucir y quitar el carácter a la canción.
Opino también, que el director debiera ir uniformado, como es clásico en este tipo de agrupaciones, lo cual no quita personalidad, pero en cambio desentona, rompiendo la vistosa armonía del conjunto» La noche. (5 de agosto de 1954) Ano XXXVI. N.º 10431. p. 4
Alguns dias depois, Francisco Rodríguez, respondeu um tanto zangado perguntando a Celestino por que ele não lhe dera aquelas gentis recomendações na conversa que os dois tiveram o dia do concerto.

«En lo que al Director se refiere, estoy de acuerdo en que debe vestir igual que los coristas, para no desentonar el conjunto. Espero que en su día quede resuelta esta cuestión, que es asunto interno de la Colectividad.
En cuanto al empleo y afinación de las gaitas acompañando al Coro en alalás y foliadas, estas, que son casi siempre a dos voces al disponer de dos gaitas es lo lógico que cada una se emplee, respecto del Coro, oportunamente en cada voz: porque si se suprime una de las gaitas, evidentemente reproduce un desequilibrio sonoro en el conjunto, lo que supone peor el remedio que la posible desafinación.
¡No suprima gaitas, don Celestino! Hace pocos meses he visto y oído un prestigioso coro de nuestra región actuar simultaneamente con tres gaitas, y no sé que tengan ningún propósito de suprimir alguna…
Los tiempos evolucionan, y esta misión “sagrada” de suprimir gaitas y folklores queda reservada a la música importada llamada de negros, que se me antoja ya infiltrada en la ropa. La Noche. (14 de agosto de 1954) Ano XXXVI. n.º 10439. p. 2

Celestino contra-atacou com seus velhos argumentos, aliás, não tão distantes dos de Francisco Rodríguez. 

«Las composiciones musicales armonizadas están destinadas a ser interpretadas por orfeones y polifónicas masas corales en las que todas sus cuerdas están bien nutridas de voces y no dan la sensación de debilidad y pobreza.
El quitar a un coro gallego de la interpretación de las canciones “folklóricas” es lo mismo que oirle tocar a una gaita la rumba del “negro zumbón”. Cada cosa es para lo que es.
[…]
Si como observamos la tendencia “moderna” a orfeonizar toda nuestra música regional, aun aquellos cantos del mayor sabor enxebre, entonces es preferible dejar los trajes que representan al tipo individual de nuestros paisanos en traje de fiesta, y se toquen con smoking o chaquet». La Noche. (24 de agosto de 1954). Ano XXXVI. nº. 10447. p. 4
 
O confronto não durou muito porque no ano seguinte Cantigas se apresentou nas festas do Nazareno e, em 1958, Celestino e Francisco Rodriguez foram nomeados sócios honorários na mesma sessão da junta diretiva do coro compostelano.
Em julho, uma delegação de Cantigas e Agarimos desloca-se à Póvoa do Caraminhal, sendo recebida polo próprio Celestino, talvez em agradecimento pola sua nomeação como sócio honorário da entidade. Então, escreve um novo artigo onde faz algumas reflexões reveladoras da sua visão sobre o papel das mulheres nesses grupos. Ao serem incorporados aos corais, na década de 1920, estavam prestes a dar um passo decisivo na defesa de seus direitos. Até então, era de se esperar que fizessem parte das Hijas de María, sendo inapropriado do seu sexo cantar em coros seculares e mistos.
Além de se exporem publicamente em eventos em que participavam coristas de ambos os sexos, participavam em excursões dominicais, como recordou Celestino, a parques de merendas do Castinheirinho, Amanecida ou o Caminho Novo. Todavia, os coros giravam, durando as turnés dias ou semanas, como quando um destes grupos tinha de atravessar o Atlântico. Foram, as coristas, mulheres valentes. Mas este avanço para elas, sem dúvida histórico, não significa que todos os preconceitos arraigados no cérebro dos coristas masculinos foram repentinamente erradicados.
Celestino faz uns comentários no jornal La Noche que sintetizam toda uma ideologia patriarcal e paternalista, expressões que não são sinónimos perfeitos, mas sim complementares. O franquismo instaurou o machismo de estado, mas, obviamente, a ideologia já fora inventada.

«Hubo tiempos, no muy remotos, que el pertenecer a una colectividad artística era el mayor honor que podía caberle a un artesano. Con fe y entusiasmo, se sacrificaba por parte de “ellos”, el tiempo que podían invertir en tomar y charlar la penúltima chiquita de la noche para dedicarlos a las tareas artísticas, y por parte de “ellas”, las últimas vueltas en los paseos cotidianos por las calles y rúas de las ciudad.
¿Es más honroso y decente para las chicas artesanas, el pulular por calles y jardines o frecuentando los lugares mas concurridos para su mayor exhibición? Como hombre, les manifiesto que no son precisamente esas las mejores armas para buscar el compañero ideal, porque la modestia, la sencillez y la virtud, son como la violeta que aun estando oculta, se la busca por su pureza, belleza y perfume
Al pertenecer a una agrupación artística, demuestra la delicadeza y perfección espiritual, vestir ese traje tan gracioso y elegante y enxebre, cantar las alegres foliadas y sentimentales alalás, etc., le dan un encanto y pureza de alma, que significan un poderoso imán para los mozos, y así hemos visto, que muchas chicas que han pertenecido al coro, han encontrado sus ideales en él y fuera de él, que seguramente no hallarían de otra manera por mucho que se lo propusiesen, y soy testigo que fueron objeto en todo momento del mayor respeto, las mayores consideraciones y de las más cariñosas manifestaciones de afecto en casa y fuera de ella» La Noche. Ano XXXVIII. n.º 11696. 30/08/1958

Duas filosofias diferentes são misturadas aqui. A krausista, influente nos coros Clavé, em que se pretendia educar as classes trabalhadoras através da música, afastando-as, entre outras coisas, das tabernas e do alcoolismo. Por outro lado, o movimento antoniano e os círculos católicos.
Estes procuravam captar aos jovens que saíam da tutela da igreja, ingressando em associações seculares, como as de influência krausista, ou em organizações políticas de esquerdas. As mulheres aqui se dedicavam a atividades artísticas, como teatro ou apresentações musicais, muitas vezes sem rigoroso conteúdo religioso, mas sempre com uma moral cristã impecável. Em ambos os casos, fossem as intenções melhores ou piores, tratava-se de controlar o lazer, principalmente no caso das mulheres, não foram a decidir ir livremente para onde quisessem. Um episódio ocorrido no ano da fundação de Cantigas e Agarimos ilustra perfeitamente como a mulher e colocada forçadamente no centro do “problema”.
Os primeiros ensaios de Cantigas decorrem nas instalações do Centro Católico Obrero de Santiago. Logo eles têm que deixar este espaço e são realojados nos da Unión Protectora de Artesanos. A causa foi, justamente, que os católicos não concordavam com a presença de mulheres no coro. 

Em 1956, Celestino é nomeado presidente da Sociedad Liceo Pueblense, sendo reeleito em diferentes convocações. 

Despedida 

Em novembro de 1964 morre Manuela Segade López (1904-1966). Este fato marca o ocaso da vida de Celestino López. Em novembro de 1966, escreve em El pueblo gallego uma emocionada despedida a vizinhança da Póvoa. Problemas de saúde levam-no a residir em Vigo. A partir daí continua a colaborar nos especiais publicados pola imprensa durante as festividades nazarenas. Essas colaborações, solicitadas por seu amigo Juan B. Martínez Lemiña (1906-1975), são um dos poucos vínculos que lhe restam com a sua vila de residência durante mais de quarenta anos. Celestino López Sánchez morre em Vigo o 26 de Agosto de 1971. A causa oficial foi infarto do miocárdio. Foi enterrado no cemitério de Pereiró. 

 Finalmente

Durante a escrita desta pequena biografia tive a oportunidade de conversar com algum ex-aluno de Celestino López. Eles lembram-se dele como dum professor muito rigoroso. É evidente que sempre foi acompanhado por uma disciplina militar, talvez alimentada desde cedo nos exploradores de Ponte Vedra. Para além do quão simpático achemos a personagem, é claro que a sua atividade como gaiteiro, guitarrisista e corista fazem dele alguém a ter em conta e a quem devemos continuar a investigar. É possível que a partir dessas pesquisas tragamos à tona novos achados reveladores. Vamos ver.

Arquivo de Imprensa



quarta-feira, 31 de agosto de 2022

n° 253 Eu ia dar um passeio por Rianxo quando


Eu ia dar um passeio por Rianxo quando, 

inesperadamente,

encontrei-me com Walt Whitman.

Cumprimentei,

e ele me cumprimentou.

Nervoso,

toquei a haste dos meus óculos;

Whitman,

acariciou a aba do seu chapéu.

Perguntei a ele por Wilde

‒a quem beijou nos lábios em Camden‒

Ele interessou-se por Manuel António

‒a quem rezo todas as noites antes de dormir‒

Invejei-lhe o cabelo e o talento.

De mim, apenas invejou as minhas cinco décadas.

-Goodbye, Mr. Walt.

-Goodbye, Barão de Orjais.

Quase me virava as costas

quando escutei que sussurrava:

-Many things to absorb I teach to help you become eleve on mine.

Barão de Orjais de If I were a Whitman.




Barão de Orjais, de If I were Mr. Walt

terça-feira, 2 de agosto de 2022

Nº 252 Crónica negra da Sanfona

 Em 13 de novembro de 1863, aparece no Boletim Provincial de Lugo a seguinte nova:

Don Antonio del Rio y Cuesta Juez de primera instancia en la villa de Noya y su partido.

Por el presente se cita, llama y emplaza por el termino de treinta días perentorios á Lucas Casal Tarpa, vecino de la parroquia de San Nicolás de Mosteirón lugar do Outeiro, Ayuntamiento de Sada, partido de Betanzos á fin de que se presente en la cárcel pública de esta capital á responder á los cargos que contra el mismo resultan en causa criminal sobre la muerte de Feliz Romero, pues no haciéndolo se sustanciará con los Estrados y le parará el perjuicio que haya lugar. Al propio tiempo se exhorta con las Autoridades civiles y militares para que procedan al arresto de Lucas y su remisión caso ser habido. Noya 26 de octubre de 1863. Antonio del Río y Cuesta. Manuel Ramón Martelo. Escribano Originario.

No mesmo breve do jornal, dá-se a descrição do suposto assassino:

Edad de 40  á 44 años, estatura alta y de buen color, es tuerto y deja caer sobre el ojo un gran mechón de pelo: viste chaqueta negra y azul, pantalón de lo mismo y algunas veces de tela, unos zapatones y un sombrero ongo de lana blanca por encima de un pañuelo encarnado que ciñe á la cabeza, tambien tiene uno ó dos aretes en las orejas y gasta capa negra, ó azul, toca Zanfona y algunas veces lleva alforjas cruzadas al pecho y además anda con un perro pequeño color pardo ceniciento y adiestrado en juegos, tiene cédula de vecindad del número primero espedida en 22 de Abril de este año. Registrado núm. 949

Em 17 de junho de 1864, o sanfonista Lucas Casal continuava em fuga e captura, pelo que e publica novamente no Boletín Oficial da Província de Lugo o mesmo edital, mas esta vez com ligeiras modificações nos nomes dos protagonistas. Lucas Casal Tarpa aparece agora como Lucas Casal y Jarpa e a sua vítima como Félix -e não Feliz- Romero.

Absolutamente fascinado por encontrar-me com uma descrição tão minuciosa dum sanfonista galego de mediados do século XIX, acudi ao Arquivo diocesano de Compostela na procura da verdadeira identidade do cego de Mosteirão.

Se em 1863 tinha entre 40 e 44 anos, o sujeito devera ter nascido ca. de 1823. Num intervalo duns 50 anos a redor dessa data (1800-1850), não encontrei mais que a um Lucas Casal cuja partida de nascimento dizia o que segue:

Em 18 de octubre, año de 1823, el Br. Dn. Manuel Benito Milleiro, cura propio de esa parroquia de S. Julian de Osedo y S. Nicolas de Mosteirón su anejo, en esta bauticé solemnemente y puse los santos óleos a un niño que nación el mismo día, hijo de lexítimo matrimonio de Juan Casal y de Josefa Prego su mugger vecinos de la dicha de Mosteirón, púxosele por nombre Lucas María. Fue su madrina Dª Josefa Ramos...

De ser esta pessoa a que andávamos a procurar, havia, novamente, um problema com o seu segundo apelido. A solução pode estar na própria partida de batismo, na relação que se faz das avós. 

Abuelos paternos Pedro Casal y Fca. Rodríguez difunta vecina de la dicha Mosteirón; Maternos Marcos Prego, difunto y María Jaspe, cecinos que son y fueron de la parroquia de Osedo. 

Semelha que Lucas María Casal Prego, adotou nalgum intre o apelido da sua avó materna, passando a se chamar Lucas Casal y Jaspe. Segundo o mapa cartográfico dos apelidos na Galiza [https://ilg.usc.es/] o apelido Jaspe só tem alguma ocorrência em três concelhos galegos, com uma máxima porcentagem povoacional no de Oleiros, vizinho a Sada.

Com estes dados à vista, considero que podemos afirmar que o sanfonista acusado de causar a morte de Félix Romero foi o sadense Lucas María Casal Prego (Mosteirão, Sada, 18 de outubro de 1823; ?), cujo nome, na cédula de vecindad devia aparecer como Lucas Casal y Jaspe.

E quem era em realidade este sanfonista de Mosteirão? Apenas sabemos mais que alguns dados biográficos e só contamos, que não é pouco, com a sua descrição física para fazermo-nos um ideia do ser aspeto. O fato de levar chapéu de hongo branco e aretes nas orelhas, faz com que pensemos na hipótese de ser um marinho, quiçá reconvertido a cego andante depois dalgum acidente no exercício do seu ofício. Os chapéus de hongo branco, chambergos, de obispo ou de caminho, que de todas estas maneiras eram chamados, foram usados nas colónias espanholas de ultramar, como Cuba ou Filipinas. Os aretes nas orelhas também podiam reforçar a ideia de ser um marinho veterano. Mas, fique claro que nos movemos no terreio das hipóteses. Enquanto trabalhava na personagem de Lucas Casal foi-se formando na minha cabeça a imagem de Lucas Casal que se tornou imediatamente esboço no meu caderno de notas. Coloco aqui os desenhos só para que o pessoal acredite o mal que me funciona por vezes o meu caletre.

                                                                 ©Orjais

As liortas entre músicos e comediantes, e em geral todo tipo de feirantes, foram habituais e, como nao podia ser doutro modo, os cegos iam bem armados. No cintura levavam um punhal, pois como dizia Pablo Mendoza de los Ríos (1737) havia "ciegos, no de amor, sinó de bayna abierta".

Mais nao sempre eram os culpáveis da briga, as vezes apareciam como simples vítimas.

También se vió ante el mismo Tribunal la causa procedente del Juzgado de Cambados, por el delito de atentado contra Benito Rodríguez y José Manuel Rañó Ferreirós.

Refiere el Fiscal, que durante la tarde del 24 de Junio del año último, el Guardia municipal de Carril Arturo Meigide Otero, que como tal agente de la autoridad se hallaba prestando servivio en la romería de San Juan, que se celebraba en Bamio, reprendió á los procesados por estar maltratando á un ciego que pedía limosna tocando la zanfoña y aquellos lejos de atender sus indicaciones, le acometieron dándole de bofetadas y agarrándole de las barbas, recibiendo también otra bofetada Amador Sijas López, que le hizo sangar por las narices, de mano del Benito, al acudir en auxilio del mencionado Guardia, requerido poe este al verse acometido por ambos procesados.

Que son autores los procesados, y procede imponer à los mismos la pena de 3 años, cuatro meses y ocho días de prisión correccional, multa de 150 pesetas con las costas. La Correspondencia Gallega: diario de Pontevedra: Ano XIX nº 5349 7/12/1907

Então, em 1906.  ainda caminhavam os cegos de sanfona por Bámio, Vila Garcia. talvez numa das suas últimas aparições nestas terras. A sua presencia polo Salnês faz-me pensar nos desenhos de Castelao, tão realista no trazado dos instrumentos. É evidente que o caricaturista rianxeiro teve oportunidade de tomar apontamentos do natural em feiras e romarias da contorna como Sao Ramão de Bealo ou do Santiaguinho de Padrão ou em qualquer outro lugar, mesmo Rianxo, a onde chegara um cego andante. E é por isso que os seus desenhos, só precisam de soar.


quinta-feira, 20 de maio de 2021

nº 251 Fina Galicia: Uma Diva ye-yé (1ª parte)

 

Heterodox@s Galeg@s 01

Fina Galicia: Uma Diva ye-yé (1ª parte)

De Fina Galicia sabemos mais bem pouco. No meu arquivo pessoal conto com alguns documentos onde reconheço a uma mulher formosíssima, elegante e com uma voz que às vezes acada níveis de excelência. Mas, com certeza, desconheço quase que tudo desta artista que aparece arredor de 1955; que transita pelo cimo da sua popularidade nos primeiros sessenta e cujo rastro dilui-se pouco a pouco ate se converter numa espécie de personagem legendária. Anuncio desde já que não tenho todas as respostas, mas sim quisera fazer uma primeira aproximação que conduza à descoberta duma mulher corunhesa da que fiquei, devo dizer, absolutamente fascinado.  

De Josefa López a Fina (Finita) Galicia.

Em 1958, El Pueblo Gallego (23 de agosto), publica uma entrevista feita a Fina Galicia na que a cantante achega alguns dos escassos dados biográficos que temos dela. Por uma das suas resposta sabemos que o seu nome real era Josefina López, mas ela mudou seu apelido polo de Galicia porque «nací en la Coruña, enxebre cien por cien; [y] a que tuve empeño frente a consejos de adoptar otros nombres ya tópicos, como “Granada”, “Andalucía”, etc. este de mi tierra que tanto amo». 

Também nos informa de que seu instrutor foi o maestro Quiroga (1899-1988), o popular compositor de Tatuaje ou Ojos verdes, proprietário duma editora e duma academia onde selecionava e instruía a futuras estrelas.

Porém, antes de 1958, e apesar da sua juventude, a cantante corunhesa já contava com um pequeno curriculum que incluía uma viagem a Venezuela e a México, périplo no que deveu realizar atuações nalguns canais de TV, principalmente venezolanos.

 

1955-1958. Das noites do Morocco à tournée com o Festival en Gilacolor.

 

1954. As primeiras notícias na imprensa que temos de Fina Galicia remontam-se a 1954 e a relacionam com um dos géneros onde vai concorrer nestes primeiros anos da sua carreira: o flamenco. Como se verá, compartirá cenários com alguma das primeiríssimas figuras do cante da pós-guerra, mesmo, nalgum caso, com os mais grandes: Manolo Caracol e La Paquera de Jerez.

 

“Teatros.

Price.- 7 (¡éxito!): Festival del cante. La Paquera de Jerez, Paco Isidro, Montoya, el Posaero, el Culata y todos los ases de la baja Andalucía. 11 noche, función homenaje a la Paquera de Jerez y 11 macarenos. Grandioso fin de fiesta, com intervención de Manolo Caracol, Finita Galicia, Camilín, Juanito Campos, Dolly Montenegro, Gloria y Shanfres, el Pili, Adela Borja y principales figuras de la escena. ¡Será un acontecimiento!”. Hoja del Lunes de Madrid, 27 de setembro de 1954 in https://aventurerosdelflamenco.blogspot.com

 

1955. A continuaçao de pisar as tábuas do madrileno teatro Price, a atividade da nossa biografada desloca-se a Barcelona, atuando na Alameda del Cómico e, acabada a temporada de verão, no teatro Victória com um programa de variedades. Não é até fins desse ano que volta a Madrid, esta vez para atuar em Salas de Festa como o cabaré Morocco, inaugurado só cinco anos antes.

 

Durante o biénio 1956-1957 não encontramos nenhum dado relacionado com Fina Galicia na imprensa galega e espanhola. Pensamos que neste tempo deveu ter alguma oferta, como já dissemos, para ir fazer as Américas, radicando-se em Venezuela e, quiçá, deslocando-se para algum trabalho a México.

 

1958. Manuel Gila Cuesta Gila (1909-2001) já era uma personagem muito popular em 1958, principalmente pola sua participação numa dúzia de filmes, nalgum deles como protagonista. O Festival en Gilacolor, produção de José Mª Lasso de la Vega, um dos mais grandes produtores e representante de artistas da época, vinha a ser como um espetáculo de variedades com números intercalados entre os monólogos do humorista madrileno. Portanto, um espetador podia rir com as chamadas telefónicas do Gila e a um tempo desfrutar duma vedete cantando e mostrando “palmito y salero”, um quadro de baile flamenco, um conjunto vocal ou o genuíno ballet francês (sic) “Las Gila girls”. E entre aquele elenco heterogéneo, a colaboração especial da nossa Fina Galicia. Não sabemos se a cantante corunhesa fez a gira completa de Gilacolor polo estado espanhol, mas podemos localizá-la no mês de julho no teatro Calderon de Barcelona e nos galegos García Barbón, Malvar e Rosalía de Castro em agosto. Em qualquer caso, o projeto não durou mais de uma temporada, quiçá apenas uns meses, já que neste mesmo ano Fina Galicia ingressa no elenco do madrileno Teatro Fuencarral. Desta etapa ficou para a posteridade a belíssima capa de Primer Plano, Revista española de cinematografía, com um retrato da cantante corunhesa de enigmática elegância. 

 

Arquivo do Pico Rodríguez

 

A pé de página podemos ler: “Fina Galicia. La sensación de Madrid. A su vuelta de América y parte de Europa, Fina Galicia se presentó em el teatro Fuencarral como primerísima figura de la canción, logrando ser aclamada por su arte extraordinario, juventud y belleza”. Primer Plano. 1958

 

1959-1963. A vedete.

 

1959. Em janeiro do 1959 Fina Galicia trabalha no espetáculo De lo bueno… lo mejor, de Rafael Farina. No elenco, ademais deles dois, encontramos nomes como Los Chimberos, Hermanas Bernal e Jorge Sepúlveda. 

 

1961. Não sabemos o tempo que a cantante corunhesa passou com o cantaor salmantino, mas não é até o ano 61 que volvemos encontrar anúncios com seu nome, esta vez como estrela principal no cabaré Villa Romana de Madrid.

 

Na frequente alternância ou convivência entre a vedete e a cançonetista pseudo-folclórica, Fina participa dum novo espetáculo, La sangre morena, esta vez de Ochaíta e Valerio e música de Solano. Estes três criadores de canções ostentam o duvidoso honor de ter composto nada menos que o Porompompero. La sangre morena tinha como primeiras figuras a El Príncipe Gitano, o da “icónica” interpretação de In the ghetto, e a Dolores Vargas, irmã do anterior, conhecida artisticamente como La Terremoto. 

 

1962. Durante o ano 1962 não encontramos o seu nome anunciado mais que entre as atrações dalguma sala de festas como a Teyma, situada na madrilena praça Callao. 

 

1963-1965. A época dos Festivais de la Canción.

 

1963. Do 21 ao 23 de julho de 1963 celebrou-se na Praça de Touros de Benidorm o V Festival Español de la Canción organizado pola R.E.M., ou o que é o mesmo, a Red de Emisoras del Movimiento. Neste festival o prémio principal e de maior quantia era para uma canção, não para quem a interpretava, mas obviamente o prémio para o cantor ou cantora era uma ajuda importante na procura dum espaço no competitivo mundo da canção ligeira. Por ali passaram artista como Raphael, o Duo Dinámico ou Julio Iglesias, assim que Fina Galicia deveu de ver parte dos seus sonhos feitos realidade quando lhe foi concedido um segundo prémio dotado com 20.000 pts. O No-do filmou parte do evento, graças ao qual podemos ver uns poucos segundos de imagens em movimento da cantante corunhesa.

 

 

No-Do TVE

 

Imediatamente depois do seu sucesso no Festival de Benidorm grava para Zafiro um EP com quatro das canções participantes: Viejo reloj, Suéñame, Quédate e Cuándo y dónde. Na contracapa do disco podemos ler uma nova referência ao seu périplo polas Américas:

 

“Su nombre no suena aún em España todo lo que merece por la calidad extraordinaria de su voz y por la personalidad de su estilo. Ello se debe a que Fina Galicia há venido actuando hasta ahora em Hispanoamérica.

 

Recorrió em triunfal gira artística vários de aquellos países y actuó durante una larga temporada em la televisión venezolana”. 

 

Foto de Fina Galicia na capa duma partitura de Edicones Segovia

Arquivo do Pico Rodríguez

 

Como artista exclusiva do selo Zafiro-Iberofon vai gravar uma série de E.P’s e singles promocionais que nos proporcionam um pequeno catálogo de canções da nossa artista:

 

Z-E 434 1963

Viejo reloj – Ignacio Román-Rafael Jaén

Suéñame – Rafael de León-Máximo Baratasy-Antonio Areta

Quédate – Ignacio López García-Adolfo Garcés

Cuando y dónde – Camilo Murillo-Antonio Segovia

Z-E 491 1963

Pobre Apolo - [Ignácio] Román-M[anuel]. Alejandro

Pasó el amor - Román-M. Alejandro

Cabiar de vida - Román-M. Alejandro

Desperté - Román-M. Alejandro

00-7 Promocional 1964

Ciudad solitaria – Doc Pomus-Mort Shuman

Es inutil – Pieretti-Sonna-Privitera

00-8 Promocional 1964

Copacabana – J. de Barro-A. Ribeiro

Un poncho y un sombrero – D. Oace-G. Colonello

 

Cabe destacar como nas gravações do 1963 os autores das canções são todos espanhóis: os participantes do Festival de Benidorm e o Manuel Alejandro, compositor reclamado polas grandes figuras. Embora, os temas dos discos promocionais são todos êxitos internacionais traduzidos ao castelhano. 

 

Arquivo do Pico Rodríguez

 

 

 Arquivo do Pico Rodríguez

 

1964. Zafiro deveu querer apostar por Fina Galicia ao lançar estes discos promocionais que a levaram, inclusive, a estar nas tradicionais recepções de Franco nos jardins da Granja de San Ildenfonso, na comemoração do 18 de julho. Esta recepção a que acudia o corpo diplomático acreditado em Madrid, o Governo e as altas jerarquias da nação, contava com atuações musicais em direto baixo a direção dum velho conhecido da nossa cantante: o Maestro Quiroga. No ano 64, nos jardins segovianos, cantou Fina Galicia diante de Franco e de Carmen Polo e de lado de muitos outros artistas tais como Sara Montiel, Juanita Reina, Luis Mariano ou Tony Leblanc.

 

Nesse mesmo ano acontece algo que pode significar um cambio na carreira da cantante corunhesa. Num programa da TVE emitido o 10 de maio de 1964, Fina Galicia canta Uma noite na eira do trigo. O programa era um especial dedicado a luita contra o cancro, transcorrendo parte dele em Compostela. Não consegui ver estas imagens, polo que não sei que instrumento e instrumentista a acompanhava.

 

O certo é que Zafiro, com a produção de Ignacio Roman, vai lançar um L.P. em 1965 no que Fina Galicia interpreta um repertório completamente em galego. O disco será chamado Alma gallega e a cantante corunhesa estará acompanhada pola Agrupación Coral Flolklórica de Cámara de Madrid, baixo a direção do mestre nado em Ortigueira, Domingo Martínez Vieito. Na parte instrumental participam o gaiteiro Antonio Garcia, o tambor Saturnino Clemente e na guitarra, o próprio maestro Domingo M. Vieito.

 

Este conjunto de canções serão reeditadas por Zafiro em múltiplas ocasiões e com diferentes formatos, podendo encontrar-nos com E.P’s onde se reduziram os cortes ou em L.P’s nos que as peças de Alma gallega se misturaram com outras de diferentes discos, intérpretes e géneros. Um destes pot-pourri, tal vez o mais ilustre, é o que levou por título Voces do Pobo (1976), uma cassete que viajou nos carros de todas as famílias progres da minha geração.

 

O meu exemplar de Alma gallega, um E.P. do 1966, leva no seu interior um libreto em quatro línguas: castelhano, francês, inglês e alemão. O fato de conter estas traduções fala-nos dum troco no paradigma. Agora não se faz um produto para a emigração, para os galegos e galegas em ultramar. Interessa mais aproveitar o turismo e mesmo, neste meu exemplar, aparece um autocolante em dourados muito significativo: Recuerdo de Ortigueira.

 

  ZM-18 1965

01 N’a eira/ Ala la – Domingos Martínez Vieito

02 Negra sombra – Juan Montes-Rosalía de Castro

03 Ruliño/ Villancico (Popular) - Armonización: Domingo Martínez Vieito

04 Alalá de Amoeiro (Popular) - Armonización: Domingo Martínez Vieito

05 Son o mellor mariñeiro/ Popular – Armonización: Domingo Martínez Vieito

06 Cando a terra chama – Martínez Vieito

07 Pandeirada labrega/ Martínez Vieito

08 Foliada de Ortigueira – D. Martínez Vieito

09 Alborada gallega/Fragmento - Veiga

10 Unha noite na eira do trigo – Curros Enríquez-Alonso Salgado

11 Meus amores – Golpe-Baldomir

12 Aires gallegos/Popular  

 

1965. Em 1965, Fina vai participar no I Festival Hispano Portugués de la Canción del Miño. No parque do Possio ganha um terceiro prémio, por trás da portuguesa Maria Júlia e de Esther Gloria Prieto. Esta última, filha de Julio Prieto Nespereira e sobrinha de Obdulia Prieto Nespereira, obtêm também um segundo prémio como compositora com a canção La voz del río.

 

Em setembro desse mesmo ano, volvemos a localizar a nossa cantante em Barcelona, esta vez atuando nas Ramblas, num espetáculo onde se levará a cabo a eleição de Miss Artista 1965.

 

E depois disto, mais nada. Perdo o rastro de Fina justo quando mais me apetecia saber dela. 

 

Conclusões.

 

Fina Galicia foi cupletista, vedete, cantante ye-yé e até provou sorte na canção de salão galega, acompanhada à guitarra pelo maestro Martínez Vieito. Foi uma trabalhadora do espetáculo nas boates e nos tablaos flamencos. Quis trunfar como uma Concha Piquer ou como uma Concha Velasco, mas sem ter que renunciar às suas origens galegas. Por isso mudou o nome e teve, desde um primeiro momento, o projeto íntimo de cantar em galego. A sua biografia tem muito em paralelo com outras mulheres bravas que procuraram um espaço artístico longe da Galiza. Parece óbvio lembrar aqui à Ana Kiro. Mas Fina Galicia deixa logo de ter presença nos médios e o seu nome é ignorado na atualidade polos estudiosos das nossas músicas populares. Oxalá este artigo deite alguma luz sobre Josefa López, de nome artístico, Fina Galicia.

 

Breve audição:

 

  Viejo reloj (Ignacio Román-Rafael Jaén) Zafiro (Z-E 434)

 

Pertencente ao disco com canções do Festival de Benidorm, esta peça foi composta por Ignacio Román, produtor, também para Zafiro, do disco Alma Gallega. Rafael Jaén (1915-1984) foi o compositor da famosíssima rumba Mi carro, de Manuel Escobar. Viejo reloj é um bolero cantado por Fina com uma voz muito elegante, fazendo uso dum vibrato típico da canção sudamericana. 

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    Pobre Apolo (Ignácio Román-Manuel Alejandro) (Z-E 491)

 

Esta peça faz parte do EP de canções compostas por Ignacio Román -mais uma vez- e Manuel Alejandro, criador de êxitos para Raphael ou Julio Iglesias, entre outros muitos. No áudio aprecia-se um reverb (disculpem se não é este exactamente o efecto utilizado) comumente usado nos anos 60. A voz de Fina está, na minha opinião, mais na onda de Marisol ou Rocio Durcal que na de Concha Velasco, mas, em qualquer caso, num estilo marcadamente ye-yé.

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 Unha noite na eira do trigo ZM-18 1965

Quando um escuta a voz de Fina nesta versão do poema de Curros, pode apreciar as grandes dotes dramáticas da artista corunhesa. A gravação apenas tem um par de anos de diferença a respeito das anteriores e, sem embargo, a voz parece mais avelhentada, mais madura. Além disso, a cantora interpreta o texto até quase pronunciar a última frase num contido soluço. É evidente que nalguns portamentos a afinação entra em crise, mas resolve aceptavelmente e tem momentos onde a sua interpretação resulta absolutamente convincente. 

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Um dos grandes descobrimentos para nós deste disco foi o de poder escutar as harmonizações e interpretações na guitarra de Domingo Martínez Vieito (Ortigueira, 1917-?) Este músico militar apaixonado da guitarra merece, e talvez algum dia fagamos, um trabalho de recuperação do seu legado musical. 

 

terça-feira, 2 de março de 2021

nº 250 Dez anos de Cantos Lusófonos.


Quando andava a fazer este livrinho, a minha mulher e mais eu conhecemos à pessoa mais importante das nossas vidas: a nossa filha Dália. É por isso que o livro tem na capa um desenho desta flor e uma dedicatória para ela. 

Além disso, há três mulheres mais que participaram na composição do volumem com seu alento de companheiras e amigas: Maria Manuela, ilustradora ilustre, e Ugia Pedreira e Uxía Senlle com sendos prólogos. Nunca melhor acompanhado.

O Cantos Lusófonos leva anos esgotado nas livrarias e não sei se é possível encontrar algum exemplar de velho. Eu gosto imenso de partilhar estas canções porque todas elas fazem parte dum momento importante da minha vida, e no seu conjunto, constituem o trilho musical da minha existência.

 

 
 


 Alguma das peças de Cantos Lusófonos viajou até o meu disco Poetas nas mãos carinhosas de Alejo Amoedo e na perfeição vocal de Helena de Afonso. Que eles dois interpretem uma peça arranjada por mim é um motivo para não abandoar, quando abandoar resulta tao motivador!



          

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

nº 249 Uma coleção de fotografias de Rianxo, o Museo de la Baraja e um sujeito de Vox que passava por ai.

 

Há alguns meses comprei uma pequena coletânea de fotografias de Rianxo ao Museo de la Baraja de Madrid. O seu diretor as vendeu para mim muito baratas, sabendo que o seu destino era a vila onde as instantâneas foram tiradas. Agradeço imenso, O lote tem alguma leitura curiosa e que gostaria de partilhar. É por isso que começo mostrando-vos as belas imagens.

Fig. 1
 
Fig. 2

Fig.3
 
Fig.4
 
Fig.5

A qualquer pessoa acostumada a ver fotografias históricas de Rianxo, o conjunto irá imediatamente sugerir duas questões:

1º A maioria das imagens são muito conhecidas por estar penduradas nas paredes do Museu de Manuel António e fazer parte da coleção de postais de La Colmena, estabelecimento de C. González.

2º Também que a qualidade de exposição das minhas cópias é muito baixa, tendo em conta que de alguma delas existem reproduções magníficas.

Sendo isto absolutamente verdade existem vários aspectos que tornam a este conjunto agora no meu poder em algo do maior interesse.

A primeira questão a ter em conta é a autoria das fotografias e a sua datação. No Museu de Manuel António, e em diversas publicações, insistem em atribuir-lhas todas a José Pérez González (1901-1942), músico e fotografo amador. Já no 2012, avisava numa postagem de Ilha de Orjais da improvabilidade, senão impossibilidade, de que alguma destas fotografias fossem do primo de Manuel António. Aquela da que eu falava especificamente, datada em 1912 e na que aparecia um homem mostrando um jornal coa notícia do afundimento do Titánic, teria que ser obra dum menino de apenas onze anos. Depois de um tempo, soubemos que em realidade essas primeiras fotografias foram tiradas por José Barreiro, ajudado pelo seu amigo e correligionário, José María Varela Torrado.

Distinguir quais foram feitas por Pepito Pérez e quais por José Barreiro é coisas de uma análise profunda para a que precisaríamos de ver o tipo de placas utilizadas, conhecer em profundidade a história de Rianxo e, por cima de tudo, saber ler uma fotografia. Este labor deveria ser uma tarefa colegiada, pois ninguém sabe de tudo, e nem preciso dizer que muito necessária.

O meu método de leitura duma fotografia semelha-se em tudo ao dum texto escrito. Começo no canto superior esquerdo e, muito devagar vou lendo até terminar no canto inferior direito. Simples.

Da leitura das fig. 1 e 2 apreciamos as seguintes diferenças:

1º Fig. 1 Os plátanos do Campo de Acima têm folhas.

Fig. 2 Os plátanos do Campo de Acima carecem de folhas. Portanto, as fotografias 1 e 2 foram tiradas em estações diferentes.

2º Fig. 1 No centro do Campo de Abaixo há um farol e a Escola da República parece que está sem pintar.

Fig. 2 Embora possa haver um problema de perspectiva, semelha que nesta altura na praça não havia um farol e que a Escola da República estva sem pintar.

Da fig. 2, na que se vê a Casa do Povo, podemos dizer alguma coisa mais. Na fachada ainda não fora colocada a placa dedicada a Ángel Baltar, assim que a fotografia teve que ser tirada antes de 1929. Também se aprecia o encofrado das colunas da esqueira pola que se acede à porta principal do Concelho. De saber quando se fiz esta obra, teríamos a data certa da fotografia.

Como curiosidade, na fig. 2 vê-se um grupo de nenos e nenas rodeando a um adulto que parece dizer-lhes algo. As crianças levam livros debaixo do braço, talvez o Primer Manuscrito ou a Encilopédia, e o adulto uma carteira cruzada ao peito, polo que muito possivelmente estejamos ante o mestre com seus alunos.

Nas fig. 3, 4 e 5, também podemos ver algo que nos situa em épocas diferentes na história rianxeira. Nas três notamos a presença da Capela de São Bartolomeu, um fito que nos permite situar perfeitamente a câmara do fotógrafo. Mas a capela da fig. 3 aparece no estado anterior à sua restauração, um elemento mais para datar este grupo. Na fig. 5 vê-se claramente a capela pintada de branco e com a espadana e a campá que lhe foi colocada na altura.

Noutra postal da minha coleção, da série de La Colmena, fig. 6vê-se claramente a capela branca com sua espadana e com a porta aberta olhando para Rianxo, é dizer, ao leste, portanto desorientada. Na fig. 3 esta porta aparece bloqueada.

                                                                               Fig.6

As duas dornas jeiteiras da fig. 3 são a Juanita e a San Antonio y Animas.

Fazia referência à baixa qualidade das imagens impressas. Na minha opinião poderíamos estar ante umas provas de impressão, já que as figuras aparecem desenquadradas no papel, com uma banda lateral em branco onde alguém anotou como recordatório, os lugares onde se tiraram as fotografias. Essa pessoa não devia ser rianxeira, pois usa expresoes como Plaza Mayor, pouco ou nada utilizada em galego .ou Alameda ,para um espaço que um rianxeiro denominaria Campo de Arriba ou de Abaixo. Mas o erro mais grande e o de denominar à Capela de São Bartolomeu como Ermita de Guadalupe.

Se observamos os postais pola parte de atrás fig.7, podemos ler impresso neles a frase Tarjeta Postal e o desenho dum anagrama com as siglas IFAG, as quais fazem referência a Industria Fotoquímica Antoni Garriga. 

Fig.7

Antoni e o seu irmão Rafael foram engenheiros pioneiros no desenvolvimento de produtos fotográficos. Rafael Garriga Roca (1896-1869) é o avó de Ignacio Garriga Vaz de Concicao (sic), candidato de Vox a Generalitat de Catalunya. Como é sabido, o político xenófobo é filho duma guinéu-equatoriana nascida antes da independência do seu país, portanto de nacionalidade espanhola. Se Ignacio Garriga fosse um Rei da Espanha, talvez o seu sonho, mereceria a alcunha régia de Ignacio I El Oxímoron, porque ele próprio é uma contradição em termos. Se ser catalão e ultra nacionalista espanhol a um tempo é um disparate, ser de Vox e negro, parece uma piada.

Todas as fotografias desta postagem pertecem ao arquivo do Pico Rodríguez, depositado no Fondo Local de Música do Concello de Rianxo.