sábado, 19 de maio de 2012

nº 134 As oito covinhas do Palheiro.

Ontem, sexta 19 de maio, saímos o meu amigo Carlos Collazo e mais eu explorar o mato. Foi uma tarde de muito andar, na que desfrutar de paisagens e da conversa.
Na aldeia de Palheiro, o jardim de Rianjo, caminhamos cara a costa na procura dum pequeno petróglifo, o qual, segundo o meu caro amigo Carlos, é o mais formoso dos do nosso concelho. Andamos um bocadinho entre as lajes até dar com ele, e tenho que reconhecer que desde esse momento não o dou tirado da minha cabeça.
Trata-se dum conjunto de oito covinhas, uma central com sete mais ao seu redor, rodeado todo o conjunto por um círculo. 


O círculo externo está muito erodido pelo que não estou certo do seu desenho ser tal e como aparece no calco, mas as covinhas têm um aspecto muito próximo ao do seguinte esquema:

Botei toda a noite a pensar em quem faria esse petróglifo, como e por que o faria deste jeito. Não tenho respostas. Não sou arqueólogo, nem matemático, mas, por pura brincadeira vou construir uma hipótese, tão acientífica como sugestiva. Não me tomem a sério.

Tenho lido muito sobre os petróglifos, como se faziam, que técnicas se utilizavam e mesmo arriscadas interpretações sobre a sua utilidade ou significado, mas muito pouco sobre o processo criativo do artista rupestre. Um desenho como o da aldeia do Palheiro, precisa dum certo poder de abstracção, de conhecimentos sobre as proporções, as propriedades do círculo... Quem fiz esta agrupação de covinhas quiçá era um artista que traçou primeiro um rascunho ou copiou dum modelo que vira em algum lugar, que estava no seu cérebro por tradição, por imaginação, por alucinação...
Quiçá a forma mais doada de traçar sete círculos equidistantes entre sim e com um oitavo que se situa no centro seja colocando discos sobre a laje até conseguir que tenham uma disposição harmoniosa. Também se pode ir desenhando a mão alçada, corregendo até conseguir o modelo desejado, mas podemos pensar que o autor desta gravura fazia parte uma civilização suficientemente evoluída como para poder desenhar um heptágono inscrito numa circunferência. 

A recta AB,mediatriz do rádio, tem o mesmo tamanho que as cordas dos arcos. Resulta pois, bem doado, traçar um desenho similar ao do monte Palheiro, só com a ajuda dum compasso e sem recorrer ao número pi. 


Agora que já temos o desenho feito, haverá que buscar-lhe um significado. O mais destacável é o número de círculos, sete na contorna de um central. O sete é um número muito presente na nossa cultura, pois segundo a religião cristiana, Deus criou ao mundo em sete dias, é dizer, uma semana. Mas a divisão da semana em sete períodos de vinte e quatro horas tem a ver com a ideia do universo que tinham os antigos. 

«El sistema astronómico de Ptolomeo, que se mantuvo vigente en Occidente hasta que cuajó la revolución copernicana, estaba basado en la cosmología aristotélica, la cual estaba inspirada, a su vez, en los modelos mesopotámicos y egipcios. En este modo de concebir la estructura del universo, la Tierra ocupaba el centro, y los planetas y estrellas giraban a su alrededor. Aristóteles, haciéndose eco de las creencias de su tiempo, imaginó que todas las estrellas fijas se hallaban como incrustadas en una enorme esfera cristalina que envolvía el universo conocido, como su capa más externa. En el interior de esta esfera había otras siete, todas concéntricas a la Tierra, de forma que cada una de ellas alojaba a uno de los siete planetas conocidos (incluyendo como tales al Sol y a la Luna) y era responsable de su movimiento.»  Fonte

Seguindo este razoamento geocêntrico, o círculo externo da gravura do Palheiro poderia ser a esfera das estrelas fixas, os sete círculos exteriores o Sol, a Lua, Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno. O círculo interior, a Terra.

Mas, falando de heptágonos, planetas e círculos, não podemos esquecer a Estrela de Sete Pontas, que podemos traçar seguindo os nodos que nos marcam o centro das esferas.



Não lembra este último desenho ao Vitriol dos mações?


Para mais enredar todo, uma última imagem tirada da web http://www.horusmedia.de. Tem um cabeçalho verdadeiramente curioso: «Línea del Grial. Dibujo según un modelo de la estrella de siete puntas de los Caballeros Templarios de Francia que indica la ubicación de las principales comandancias de su orden y la línea del Grial.»

Enfim, que o mais provável é que o petróglifo do Palheiro não seja mais que uma espécie de mancala pré-histórico. Tal vez, faz alguns milhares de anos, dois povoadores destas terras, jogaram uma partida contemplando uma vista formosíssima da nossa Ria.

Para rematar esta postagem, colo alguma imagem mais das que pudemos encontrar na mesma laje que a que vimos de comentar. Estava já a cair a tarde e não pudemos demorar mais o regresso. Para outro dia ficaram as medições, os desenhos e se estou inspirado, as fantasias.

Máis covinhas...
Pegadas que derretem rochas?
Para isto não tenho palavras...

segunda-feira, 16 de abril de 2012

nº 133 Faustino Rey Romero e os Poetas dos Melros.


Abstract:
Breve relato sobre curiosos encadeamentos históricos que nos levam a crer na existência na Galiza duma geração poética à que poderíamos chamar Ornitólogos sentimentais, ou melhor dizendo, Os poetas dos melros e a sua relação com o Festival de la Canción Gallega de Ponte Vedra.

Eu quisera ser melrinho
e ter o bico encarnado,
para fazer o meu ninho
no teu cabelo doirado.
Quadra Popular.

Tragédia com três personagens

«Amor!» «Amor!»
-assobiava o Melro
Seu assobio
tinha algo quente
que dava frio

«Amor!» «Amor!»
- A Rosa, indiferente
não respondia

«Amor!» «Amor!»
- A Lua filosófica
sorria

«Amor!» «Amor!»
-assobiava o Melro

-A Rosa, cruelmente
não respondia

Enlouquecido
o pobre Melro
botou-se ao rio

De indiferente
a Rosa
passou a presumida

-A Lua
por ser tarde
deitar-se
ia

Ernesto Guerra da Cal Lua de Alem-mar 1959

Este formoso poema de Ernesto Guerra da Cal, dedicado a Fermín Bouza Brey, pertence ao livro Lua de Alem-mar e leva por subtítulo «para ornitólogos sentimentais». Na fina ironia do escritor ferrolano parece esconder-se uma alusão a toda uma geração de poetas herdeiros da poesia de Amado Carvalho e que, por diversos motivos, vão ser protagonistas dum evento pouco ou nada estudado até o momento: o Festival de la Canción Gallega de Ponte Vedra. Este festival celebrou-se entre os anos 1960 e 1967, sendo promotores Antonio Fernández Cid, crítico musical, e Xosé Filgueira Valverde, presidente na altura da câmara pontevedresa.
A mecânica do evento consistia em que compositores espanhóis e portugueses de grande sucesso musicavam um poema dalgum autor galego. Paralelamente, havia um concurso de composição do que saíam partituras premiadas. Durante uns dias, sempre nas datas próximas à festividade de São Bento, pronunciavam-se conferências-concerto, na que se interpretavam as obras encomendadas, as do concurso e outras de carácter histórico como ilustração às palestras.
Ernesto Guerra da Cal foi o autor dalgum desses poemas musicados, sendo a sua participação estudada por mim, em parceria com Isabel Rei e Joám Trillo, em dois trabalhos que sairão do prelo em breve. Mas além do poeta ferrolano, houve outros coetâneos que também participaram com seus versos no festival e aos que poderíamos chamar os Poetas dos Melros, dado que todos eles foram rapsodas deste passarinho de plumagem escura e bico amarelo.
Comecemos pelo próprio Guerra da Cal. O poema acima transcrito e titulado “Tragédia com três personagens” está incluído num grupo de seis poemas cujo título genérico é Cançonetas do Amor em Clave de Lua. Este pequeno conjunto tem muitas das características que Méndez Ferrín atribui à por ele chamada geração do 1936, como o neotrovadorismo, influência de Bouza Brey, ou o hilozoísmo/imaginismo, de Amado Carballo. Tanto Bouza Brey como Amado Carballo foram distintos Ornitólogos Sentimentais, sobrevoando o seu parnaso particular lavandeiras, rouxinóis, pintassilgos e, como não, algum melrinho.

«Fugiram as badaladas
ao acordar a manhã,
entre xílgaros e melros
pelo mato a rebuldar.»

Amado Carballo “Romage” Proel 1927

«Que não fujam os melros que fazem o ninho
no mais mesto curruncho dos teus verdores:
esgarçar-te-ei as polas muito amodinho
p[a]ra fazer um feitiço p[a]ros meus amores»

F. Bouza Brey Nós nº 12, 1922

«Todo o que é lírio, todo o que é melro
esfolar-se-á pelos campos galegos!»

F. Bouza Brey Nau Senlheira 1933

Ambos os dois poetas, Bouza Brey e Amado Carballo, foram musicados pelos compositores do Festival de la Canción Gallega, nomeadamente este último, cujo poema Ponte Vedra tornou-se num autêntico standard. 
Porém, os mais significados melristas pertencem à geração do 36, nascidos por volta do 1910. 
De entre todos eles, Xosé Mª Álvarez Blázquez teve um especial protagonismo no Festival, sendo um palestrante fixo das conferências-concerto. Os seus relatórios versaram sobre temas muito diversos, como as cantigas medievais ou os cantos de natal, estando sempre acompanhados de exemplos musicais. Também considero que deve atribuir-se lhe ser o primeiro em pôr o foco sobre o humilde melro, humanizando-o e vestindo-o com toda a sua roupagem simbólica:

O melro poeta

Da gorja algareira
do melro lançal
fugiam as horas
colhidas das mãos.

Co[m ]as suas moinheiras
e os seus alalás
a todas as melras
ia namorar.

Na pola mais alta
do meu salgueiral
morreu o poeta:
no papo, nem grão!

Ponte Vedra, 7-VI-1932

Ainda maior presença tem o melro na obra de Emilio Álvarez Blázquez, irmão de Xosé Maria e que também estivo muito envolvido na história pública e privada do Festival de la Canción. Ele escreveu coisas tão formosas como estas:

Cantaram os melros
e haverá um arzinho
entre os amieiros.

Emilio Álvarz Blázquez “Bico” Poemas de ti e de mim 1949

Meu reino não é desta árvore,
disse o melro, e pus em cruz
as asas sobre a paisagem...

Emilio Álvarez Blázquez O tempo desancorado 1988

Contudo, o poeta mais devoto dos melros é o Rianjeiro Faustino Rey Romero, o qual mesmo escreveu uma monografia poética sobre este passarinho, Escolania de Melros. O livro consta de vinte sonetos cujo protagonista é sempre a ave de pena negra.

O Melro

Prestidigitador de melodias,
que, sem cânon saber nem seguir pauta,
cantando a reo, nunca te extravias
no ar do rimo, voadora flauta.

Diz, que arame subtil é esse em que enfias
como doas de ouro a nota exata?
De que mestre aprendes-te a que assobias,
melodia lançal, música intacta?

Foste anjo de Deus? Pude ser isso!
Ou pássaro cantor no Paraíso,
onde a dita perfeita o Senhor forja?

Anjo foras, se, em vez de negra pluma,
asas brancas tiveras como a espuma,
pois é de anjo canora a tua gorja.

Faustino Rey Romero Escolania de melros 1959

Resulta evidente a influência de O melro poeta de Xosé Maria Álvarez Blázquez neste soneto do padre nado em Isorna. Mesmo palavras como lançal ou gorja, poderiam ser os restos fósseis que demonstrem tal genealogia.

Desconheço a relação certa entre Faustino Rey Romero e Xosé Maria Álvarez Blázquez, nem sei se esta foi estudada a dia de hoje por algum dos biógrafos de ambos escritores, mas cabe supor que esta existiu e foi intensa. Uma das razões que me levam a pensar assim tem a ver com os próprios biodados do escritor rianjeiro. 
Faustino Rey Romero nasceu o 27 de outubro de 1924, pelo que por idade está algo mais próximo a Emilio Álvarez Blázquez, nado no 1919, que a Xosé María, do 1915. Depois de estudar no convento de Herbão, o seminário de Madrid e o de Ourense, ordena-se padre no de Tui em 1948. Desde esse mesmo momento a sua vida passa a se desenvolver por terras do sul da Galiza, como as freguesias de Cela (Mos), Barcala (Arbo), Tameiga (Mos), A Guia (Tui), São João de Amorim... Vários dos seus livros Doas de vidro 1951 e Quatro sonetos ao destino duma rosa, 1952, foram editados na imprensa Tip. Rexional de Tui.
Uma relação tão intensa dum poeta com a cidade de Tui não deveu ser ignorada por dois dos bates tudenses mais insignes, Xosé Maria e Emilio Álvarez Blázquez.
Algum poema de Rey Romero também foi musicado no Festival de la Canción. Eu tenho localizados duas partituras, uma do compositor português Frederico de Freitas e outra do galego Groba.
A de Frederico de Freitas faz parte dum álbum titulado 10 canções galegas, do que já falei na postagem anterior. A inclusão dum poema do Rey Romero de lado de outros de Amado Carballo, Bouza Brey, Xosé Maria Álvarez Blázquez e do seu irmão Emilio põe um trilho musical inigualável a geração dos ornitólogos sentimentais.  

Por último e como colofão a esta postagem, mais uma cadeia de casualidades melricas. Faustino Rey Romero tem um soneto titulado:

O melro que lhe cantou a eternidade a São Ero de Armenteira.

Por acalmar uma amorosa queixa,
por adoçar de fera ausência o agre,
apreixaste o tempo na madeixa
do teu canto uma noite de milagre.

Não renderam três séculos um segundo.
Tao prodigioso foi teu rechouchio,
que às ditosas estâncias do trasmundo
daquele Santo subiste o alvedrio.

Foste em comparação como a escada
que véu Jacob unindo terra e céu,
mas, em vez de anjos, de música baixada.

Tu semeavas eternal semente,
e o Santo estava de si mesmo alheio,
enquanto cantavas milagrosamente.

O logótipo do Festival de la Canción Gallega foi feito por Agustín Portela Paz, ilustrador do Museu de Ponte Vedra e pai do famoso arquiteto César Portela e nele pode ver-se ao Santo Ero de lado do pássaro cantor.



Este mesmo desenhador fez as capas do livro de Xosé Maria e Emilio Álvarez Blázquez Poemas de ti e de mim, 1949, da Editorial Benito Soto. Por sua vez, Emilio, também fez um poeminha sobre o santo durmichão da Armenteira.

Santo Ero

Louvado seja o Santo
que está no Paraíso
e não queria tanto.

Louvada seja a hora
de Armenteira, que foi
trezentos anos glória.

Louvado o passarinho,
de quem ninguém se lembra
e está no Paraíso....

Emilio Álvarez Blázquez “Tríade de Três Santos” Lar 1953

Por certo, na revista Lar, do Hospital Galego de Bos Aires, também publicou Faustino Rey Romero em 1952 os seus Quatro sonetos ao destino duma rosa.

Enfim...

Orjais ©

quinta-feira, 8 de março de 2012

nº 132 Faustino Rei Romero musicado por Frederico de Freitas.


Ás 8 horas do 12 de julho de 1966, no Salão Nobre do Palácio da Deputação de Ponte Vedra, celebrava-se a jornada de estreias do VII Festival de la Canción Gallega. No piano, acompanhando à soprano Dolores Pérez, o grande Miguel Zanetti dava começo ao programa com as primeiras notas das Dez canções galegas.
Este conjunto de cantigas compostas pelo maestro lisboeta Frederico de Freitas  (1902 - 1980), são dez poemas musicados cujos versos pertencem à pena de Fermín Bouza Brei, Emílio e X. Mª Álvarez Blázquez, Luís Amado Carballo, María del Carmen Kruckenberg, Ramón Vidal, Ramón Cabanillas e o nosso Faustino Rei Romero.
Não espanta a participação do padre de Isorna neste agrupamento poético por quanto é bem conhecida a sua amizade com os Álvarez Blázquez ou o Bouza Brei. O verdadeiramente interessante é que um poeta relativamente pouco conhecido, como Rei Romero, passe a fazer parte da obra musical dum dos grandes compositores de Portugal.
A dia de hoje, não posso dizer certo quem fez a coletânea poética com a que trabalhou o Frederico de Freitas, mas é muito provável que fora iniciativa de Emílio ou Xosé María Álvarez Blázquez.
O caso é que depois de muita busca, dei com a partitura Canta, paxarinho, canta, que faz a número cinco das Dez canções galegas, letra de Faustino Rei Romero e música de Frederico de Freitas.
Celso Álvarez Cáccamo, filho do poeta a quem se lhe dedicou no 2008 o Dia das Letras Galegas, definiu um dos meus artigos como um trabalho detectitexto. Pois, certamente, parece-me uma grande definição para o que fago, já que às vezes quase exerço de investigador privado.
Todas as gestões feitas na Galiza para encontrar as Dez canções galegas tiveram um escasso sucesso. Então, dirigi o meu esforço cara Portugal, e concretamente ao Centro de Investigação e Informação da Música Portuguesa. Esta entidade, que não tinha cópia da obra solicitada, encaminhou-me até a Dr.ª Helena Marinho, grande pianista portuguesa e conhecedora da obra do Freitas. Ela sim sabia da existência das peças requeridas e da sua localização, junto com o resto do espolio do maestro, na Biblioteca da Universidade de Aveiro.
A Diretora dos Serviços de Biblioteca, Informação Documental e Museologia desta Universidade, Dr.ª Ana Bela Martins e a sua colaboradora Dr.ª Patricia Silva, fizeram as gestões precisas para que o escaneado das Dez Canções Galegas, e entre elas a do Faustino Rei Romero, chegaram a mim. Para elas três o meu agradecimento.
Eis a primeira página de Canta, paxariño, canta:



Expólio do Compositor Frederico de Freitas
Universidade de Aveiro


Albergo esperanças de que para maio podamos escutar esta peça em Rianjo, mas isto é coisa que já contarei outro dia.

O Faustino Rei Romero é para mim uma grande caixa de surpresas que sempre me colhe desprevenido, ele aparece onde menos se lhe espera. 
No número 3 da revista do padroado da cultura galega de México Vieiros, há um poema titulado O nome acadado dos nomes. Está assinado pelo Nobel Juan Ramón Jiménez. Nada teria de especial este poema se não fora porque ao pé do nome do autor podemos ler: «Versión galega de Faustino Rey Romero, Presbítero. Madrí, 1965»


Nº 3 Revista Vieiros
Outono 1965

Aproveito a ocasião para recomendar vivamente a leitura desta revista feita por Luis Soto, Carlos Velo e Fernando Delgado Gurriagarán. Os textos são magníficos, mas ainda melhor é a maquetagem e as ilustrações.

Memoria de Catoira 
Concello de Catoira 2011

Termino com uma foto do Padre rianjeiro na companha de Baldomero Isorna (?). Que grandes!!!

quinta-feira, 1 de março de 2012

nº 131 NÃO


NÃO

Há muitas formas de dizer NÃO.
Por activa e por passiva,
com a boca pequena ou a berros cósmicos,
acenando um dedo
ou com abalo de cabeça.
Eu digo não cantando,
com a mesma voz que entoa berços,
a voz que sussurra
e deita palavras tolerantes e serenas.
Também há quem diz NÃO
parado na rua, aguardando a chegada da malta.
Esse homem ou mulher quer companhia,
o abrigo de cem, mil, milhões de NÃOS, 
a ocupar o asfalto.
Conheço uma menina que diz NÃO
com olhos de azucar, 
e a um pai que quisera comer-lhos a lambetadas.
Conheço a um demo que negou ao chefe,
e a um anjo que continua a ser porque NÃO ousa.
Mas hoje precisamos de unanimidade.
Digamos um NÃO cooperativo
desde a profunda indignação que nos consome.
NÃO aos culpáveis da derrota,
NÃO aos submissos, aos palermas,
NÃO ao contrabando de sentimentos,
NÃO a ocupação violenta das nossas casas.
Mas, por cima de tudo, 
digamos NÃO aos grandes e pequenos papahóstias
que legitimaram, com o seu voto,
a quem nos governa.

Texto: Orjais ©

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

nº 130 Apresentando os Cantos Lusófonos.

Toca apresentar os Cantos Lusófonos, e parece que vamos ir a quanto canto lusófono há.
Eis as datas:


- Sábado, 11 de Fevereiro: Compostela: Gentalha do Pichel: 20:30
- Quinta feira, 16 de Fevereiro: Vila Garcia: Escola Oficial de Idiomas: 19:00
- Quarta feira, 29 de Fevereiro: Vigo: 20:00


Não sei o local de Vigo. Quando saiba, direi.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

nº 129 Uma sanfona na Exposición Regional Gallega.

O meu amigo do facebook, Jesús Giráldez Rivero, a quem espero conhecer em pessoa qualquer dia, contou-me que também na Exposición Regional Gallega de 1909 celebrada em Compostela, houve expostos instrumentos musicais . Segundo ele me diz, mesmo uma sanfona dum artesão de Pitelos, dado este que ele pôde comprovar na documentação que se encontra no Padre Sarmiento.
Com esta grande dica foi-me fácil encontrar referências na imprensa da época. Contudo, o que não acreditava encontrar era uma descrição tão extraordinária como a publicada no jornal Gaceta de Galicia.
O dito texto, dá-nos informação sobre medidas, materiais, questões técnicas e mesmo o nome do constructor, D. Cándido Castro López. 
A dia de hoje desconheço quem é o artista, mas é muito possível que não fora um luthier profissional, sendo uma obra feita ad hoc para a Exposición.
Um dado curioso, e que dá que pensar, é o facto de a dita sanfona ser apresentada em 1909, o mesmo ano em que Isidoro Brocos fez a sua estatuinha do Velho da Sanfona e em que estão datados os planos que publicamos no primeiro volume dos Opúsculos das Artes.
Já disse muitas vezes que as casualidades são as milagres dos ateus...


«Una zanfona

Tan curioso instrumento ha sido presentado en la Exposición, y tiene la originalidad de haber sido construída en Santiago, por el hábil artista vecino de esta población D. Candido Castro López, que está recibiendo muchas felicitaciones por lo acertado de la ejecución y lo bien ultimado que está en todos sus detalles.
La describiremos, por que es curiosísima este instrumento músico, no sin antes dar nuestra enhorabuena al joven y estudioso artista.
Es de forma de guitarra sin el mástil que forma cuerpo aparte y que está colocado sobre la caja sonora, hallándose en el sitio de éste una pieza corta de 0'15 m. que remata en espiral y en donde se encuentran cinco clavijas de boj que graduan otras tantas cuerdas.
Las dimensiones de este instrumento músico tomadas en rectángulo son: largo 0'80 m. y 0'35 m. de ancho. El aro que mide 0'15 m. de alto en su parte trasera y 0'90 en la delantera, y las tapas superior é inferior son de nogal, así como la pieza anterior.
Rodean los bordes de dicho aro dos tiras de caoba cuyo dibujo en forma de lira, resulta un adorno elegante. Componen el mástil, que es la parte más interesante, el doble teclado de boj y su correspondiente caja de nogal; está situado encima de la caja hacia adelante y unico á ella por medio de dos clavijas de hierro. Es doble  su teclado para ejecutar con é la escala cromática, indispensable en la música, hallándose provisto de unos puntos ó piececitas de boj que al herir las tres cuerdas (primas), que pasan entre ellos, determinan las entonaciones mediante la presion de las teclas (1).
Se toca este instrumento por medio de un manubrio que situado atrás, hace dar vueltas á una rueda de nogal, con resina, y que está situada perpendicularmente á la caja, quedando media rueda dentro de ésta y la otra mitad fuera de dicha caja; esta rueda al rozar con las cuerdas, dá el sonido correspondiente según las teclas que al mismo tiempo se opriman. Tres cuerdas llamadas primas que pasan por encima de la rueda y por el interior del mástil, sonando al mismo, llevan el canto ó melodía; otras dos cuerdas colocadas fuera y al lado del mástil y mas bajas  que las primas, casi tocando la tapa superior de la caja sonora, una llamada mouche (mosca) y otra petit bourdon (bordoncillo), hacen la tónica y la quinta del tono. Estas cuerdas se pueden afinar sin hacer uso de las clavijas, moviendo hacia delante ó atrás unos graduadores ó rensatitos de boj, de que está provisto el instrumento y que los atraviesan la mosca y el bordoncillo.
A la rueda que está situada detrás del mástil, en el puente de boj, colocado á espalda de dicha rueda y á la pieza, también de boj, en forma de lira en que se hallan sujetas las cuerdas, y que es la última después del manubrio, las defiende una tablilla giratoria de caoba en forma de semi circunferencia, aunque su papel principal es tapar la rueda: y como las demás piezas están colocadas inmediatamente junto á ella también las cubre. Destácase en la tapadera del mástil el nombre del constructor, tallado en hermosa letra gótica.
Tiene la particularidad el instrumento de que nos ocupamos, de armarse y desarmarse facilmente.
La zanfona fué modificación del Organistrum, cuya modificación consiste en aplicar el teclado destinado á remplazar la acción directa de los dedos sobre la cuerda que, como hemos dichoa, ejercen los puntos que están situados perpendicularmente en las teclas.
Fué instrumento muy cultivado en la edad media, y en la época  del renacimiento ha desempeñado su papel en la orquesta.
Tenía el nombre latino Organistum.
Tambíen se llamó Rota Sambrica rotula y fué instrumento de trovadores y menestrales.
Después del siglo XV, fué abandonado á los pordioseros y músicos nómadas, llamándose Lira mendicorum. También se conoció con el nombre de Symphonia.
_______

(1) El teclado superior se compone de 13 teclas y de 10 el interior. Son pues 23 teclas cada una de las cuales tiene tres puentos situados en línea recta, haciendo un total de 69 puntos.» Gaceta de Galicia, Ano XXXVIII; nº 177; 14 de agosto de 1909

domingo, 5 de fevereiro de 2012

nº 128 Uma "zampoña" na Exposicion Agricola Industrial y Artistica de Galicia


Catálogo metódico de los objetos exhibidos en la esposición (sic)
Agrícola Industrial y Artística de Santiago de Compostela.

No Ayes de mi país, que publiquei para Dos Acordes no 2010, em parceria com a Pr. Isabel Rei, acho que há poucos erros daqueles que aparecem depois de que o livro já está  editado. Mas há um que me doe como se me estiveram a tirar um dente são sem anestesia.
Na página 34 falo da relação de Marcial Valladares com o  artesão Manuel Garcia de Oca, a quem solicita umas miniaturas de utensílios de lavoura. Estas miniaturas estão destinadas a ser expostas, na Exposição de Produtos Agrícolas que se vai celebrar, e aí o meu primeiro erro, não em Compostela, senão em Madrid. Também está errada a data, 1857 e não 1851 como aparece no livro. Prometo corrigir isto se   há uma segunda edição.
A modo de compensação, achego algum dado mais que pode ser de interesse para os estudiosos da flauta.
Um ano mais tarde da expo de Madrid, celebra-se em Compostela a Exposición Agrícola Industrial y Artística. Valladares vai ter um grande protagonismo nesta mostra, achegando muitos frutos das suas propriedades de Vilaencosta. Junto aos produtos agrícolas, também havia artesanatos, com um pequeno mas interessantíssimo conjunto de instrumentos musicais.
Manuel Garcia de Oca, do lugar de Rio Bô, apresenta uma flauta de ébano com chaves de prata. Tomou como modelo a de Sérgio Valladares que ainda hoje se conserva na casa petrucial de Vilancosta?
A informação que nos dá o Catálogo metódico de los objetos exhibidos en la esposición sobre o resto dos instrumentos é muito importante, já que se nomeiam materiais, algum detalhe de carácter organológico e o nome dalgumas pessoas que podem ser construtores ou simplesmente os donos dos instrumentos.
Procedentes de Compostela, Antonio Bergaña, expõe um violino de nogueira e pinheiro embutido, Domingo Villar, uma guitarra inglesa, Urbano Anido, um realejo de cilindro, Severino Pérez, um malvisto (sic), piano harmónico. Desde Lalim, Andrés Nóvoa,  uma zampoña (sic) com registro de flauta.
Algum dos nomes que aparecem aqui são de artesãos de grande renome, mesmo nalgum caso, como o de Severino Pérez, um velho amigo meu.
Em El fomento de Galicia, na altura da Expo compostelana, aparecia a seguinte coluna:

«Don Severino Pérez, hijo de Cotovad en la provincia de Pontevedra, y alumno de literatura en esta universidad, acaba de inventar un instrumento músico que puede rivalizar dignamente con los pianos mas completos. El invento ha llamado la atención de los hombres mas notables de esta capital, entre ellos el célebre violinista don Hilario Curti, quien despues de haber ejecutado con maestría varias piezas en el nuevo instrumento, tributó mil elogios al escolar artista.
La forma del "Malvis", que así se llama esta reciente obra del genio, es la de una mesa regular; en su frente descúbrese el teclado, y el interior contiene, á manera del olvidado tímpano, tres órdenes de cristales que producen dulcísimos sonidos cuando los hieren una porción de martillos colocados con notable artificio, y que constituyen la esencia de la invención.
El artista ha dirigido al señor Zepedano, alcalde de esta capital y presidente de la sociedad económica de amigos del pais, la adjunta solicitud, pidiendo la cantidad que ha creido necesaria para la constucción de un "Melvés" digno del público que concurra en julio á la esposición compostelana. No dudamos que el Sr. Zepedano, en unión con las corporaciones que preside, sabrá dispensar al talento la protección á que es acreedor.
El señor Pérez debe enorgullecerse con el producto hermoso de sus desvelos: el laurel de las artes el el que mas ennoblece la frente de los hombres; el artista arranca á la naturaleza sus arcanos, y dice generosamente al mundo, á quien regala sus conceptos: "toma; esto es mi obra".
Felicitémonos: Galicia despierta al fin! Así nos lo prueba esa porción de sucesos que estamos presenciando; así también esa emulación noble que se observa entre sus hijos, y que concluirá por dar á nuestra pátria el esplendor y la gloria de que es digna». El Fomento de Galicia, Ano I, Nº 25, Quarta feira, 14 de Abril de 1858.

Severino Pérez Vázquez é uma personagem fascinante, inventor de artefactos com aplicações musicais como o próprio malvis, o tecnefone ou a vocalina. Oxalá que alguém, algum dia, escreva a sua biografia.
Outro dos nomes importantes é Urbano Anido, ebanista da rua do Hórreo, que bem a confirmar como muitos destes instrumentos singulares provêm de luthieres ocasionais. Neste caso, isto é apenas uma hipótese, suponho que a oficina de Anido compraria o mecanismo e, em realidade, da sua autoria, só seria o móvel.
Outro dos instrumentos mencionados é a zampoña que achega Andrés Nóvoa, mas a que objeto denomina este termo? O mais fácil é pensar numa flauta pastoril, quiçá de cana. Trata-se dum pito?