quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

nº 157 Gaiteiros com pistola.

A hemeroteca sempre nos achega notícias bem curiosas. No final do século XIX e nos primeiros anos do XX, em Ponte Vedra e arredores, junta-se um grupo de gaiteiros ilustres entre os que destacam Manuel Villanueva, de Poio, Juan Tilve Castro, de Campanhó, e quiçá um menos conhecido hoje, mas igualmente popular na sua época, José Poceiro, de Xeve. Em 1905, o orfeão da Sociedad Artística de Ponte Vedra viaja a Madrid para participar nos atos do centenário da publicação do Quixote. O elenco de sessenta e cinco vozes é acompanhado, nesta ocasião, pelo gaiteiro José Poceiro. A viagem acontece em maio. Uns  meses antes, em 1 de outubro de 1904, aparece um breve no diário pontevedrês La correspondencia deste teor: «Regresando días pasados de una feria, los vecinos de Geve, José Poceiro Maquieira, de 21 años, y Manuel Garcia Chenlo, ámbos de oficios labradores, promovieron una reyerta intentando el primero disparar un revólver contra el segundo, hecho que pudo evitar la intervención de varias personas.»

Só uns meses mais tarde, o 8 de março do 1905, o duo José Poceiro e Manuel García vai-se ver envolto no que será qualificado pela prensa como o Crime do Leres. Os feitos foram mais ou menos assim: durante as celebrações do Entrudo na aldeia de Castelo, Leres, um grupo de pessoas afetadas pelo consumo abusivo de álcool, começam a brigar na taberna de Juan Magdalena. Os moços Juan Pintos e Manuel García, acusam-se de ter-se dado um pisão no percurso do baile que se estava a realizar no seu interior. O García era cunhado de José Poceiro que naquele momento estava amenizando o baile tocando uma guitarra, segundo as primeiras averiguações, ainda que depois se soube que em realidade o instrumento tangido era um acordeão. O caso é que Poceiro soltou a sua ferramenta de trabalho para pegar num pau que descarregou sobre a cabeça do infortunado Juan Pintos. O taberneiro procura calmar a malta, mas vendo que isto é impossível resolve bota-los a todos fora. Situado detrás da banca, recebe um disparo cerca das têmporas do lado direito. Às poucas horas, Juan Magdalena falece na sequência da fatal ferida. O juiz de instrução Sr. Portas, comparecente no lugar dos feitos, detém a seis pessoas, entre as quais os principais acusados, Esteban Rey, proprietário da arma criminosa e Faustino Lorenzo. O 30 de setembro desse mesmo ano tem lugar o juízo com jurado na audiência provincial baixo a presidência do Sr. Bermúdez de Castro. A Esteban Rey Pontevedra pedem-lhe 14 anos e oito meses, costas e 2000 ptas. para os herdeiros do falecido. Na sua defesa declara: «Habiendo tomado la refriega aspecto serio y queriendo evitarlo el procesado salió á la calle y desde ella disparó por la puerta que estaba abierta y sin hacer otra puntería que al techo de la casa con una pistola de dos cañones que llevaba, para ver si consgue de ese modo apaciguar los ánimos de los contendientes y aun cuando disparó un solo tiro sin hacer más puntería que la referida, quiso la fatalidad que por variación del pulso efecto del estado nervioso en que se encontraba, fuese el proyectil á herir al tabernero con el cual no tenía resentimineto de ningun género el procesado produciéndole desgraciadamente la muerte[...].» Trás breve deliberação o jurado declara ao acusado, inocente. 

Pode parecer desmedido que José Poceiro fique envolvido nalgum outro caso delictivo, mas o 20 de novembro de 1913, José Desiderio Portela Iglesias, um moço de 18 anos, natural de Barbeito, Cotobade, entre na relojoaria de D. Claudio Sotelo e subtrai da caixa 250 pesetas. Com o fruto do seu latrocínio acode a oficina de José Poceiro e compra uma gaita pela que paga 125 pesetas. Também deixou pago um bombo e uma caixa que aguardava recolher o 6 de dezembro. Conta a crónica que Portela comprou, além do instrumental, um revólver e regular quantidade de tabaco. Foi detido às poucas horas. 

 Todos estes dados saim das crónicas da época, tudo aponta que são dados certos, salvo erros tipográficos ou do jornalista que transcreveu a crónica. Portanto, após a exposição do acontecido, ocorre-se-me lançar alguma pergunta e também, de passagem, alguma reflexão. 

 1. O José Poceiro do altercado do 1904, 1905 e 1913 é a mesma pessoa? 
 2. Trata-se em qualquer caso do famoso artesãode gaitas e de acordeões? 
3. José Desiderio Portela Iglesias será parente do Ricardo Portela, também natural de Cotobade?
4. Graças ao caso Portela sabemos que em 1913 uma gaita custava 125 pesetas. 
5. Que pode levar a um homem a roubar uma joalharia para comprar uma gaita? 
6. A crónica não desvela onde comprou o revolver o José Desiderio Portela Iglesias. Desejaria que não fora na casa do Poceiro.


1 comentário:

isabel rei disse...

ha ha ha!! Ai que caramba. A imprensa da época contava tudo e com boas explicações, não como agora, que ou ocultam ou contam o do pistoleiro da Austrália. Beijos!