Quando criança, os Sábados de tarde eram de futebol. O jogo era prioritário, e tinha de haver um grande temporal de chuva e vento para ficar na casa a ver T.V. Sesión de Tarde botava quase sempre filmes de aventuras, com Johnny Weissmüller na selva ou Errol Flynn a fazer de Robin dos Bosques. A má notícia era quando punham uma da pioneira do nado sincronizado Esther Williams e a sua escola de sereias, ou cinema espanhol com estrelas infantis a fazer esforços por não medrar.
Uma tarde que chovia a potes, sentei no cadeirão a ver um filme com o meu pai. Era de detectives privados, da hampa de Chicago e de muito tiro. Um daqueles homens de chapéu preto e metralhadora de tambor, subiu a um elevador, premeu no botão e dirigiu-se directamente ao terraço. Na Ilha, as casinhas eram pequenas e os únicos edifícios de vários andares foram construídas pelas Caixas Económicas, más apenas com escada de serviço. Na minha ignorância de puto com pouco mundo, dirigi-me ao meu pai com voz maravilhada:
- Quem dera que uma coisa assim existira na verdade!
Meu pai ficou a olhar para mim como a pensar, meu Deus, o que foi que eu fiz de errado?, mas de seguida explicou pelo miúdo que aquilo era um engenho inventado fez muito, muito tempo.
Anos mais tarde, depois de rematar a educação primária, teve de ir a Vila a estudar o secundário, na altura em que já começava a ter penugem no bigode. Fiz amizade com um natural que como bom colega, guiou-me pela sua cidade. Desde a conversa com meu pai, acho que poucas vezes subira num elevador, pelo que aquele mecanismo seguia a aliciar-me com a sua magia. Na conversa, saiu o tema da minha extravagante atracção, questão que provocou no meu colega uma sonora gargalhada. Curvei a cabeça e caminhei um bocado silencioso, percebendo o amigo, acertadamente, que me chateara. Para compensar-me, parou no primeiro portal e premeu ao chou um botão do porteiro automático. Não sei o que respondeu à voz que falou do outro lado, mas de imediato a porta abriu e passamos para o interior do prédio.
Aquela manhã teve overdose de elevador. Uma e outra vez subimos e baixamos, contando os números que se iluminavam ao nosso passo, cumprimentando com os transeuntes que nos olhavam com indiferença. A partires de então, perdi parte da minha paixão pelos elevadores, que só recuperei um dia que subindo ao andar do meu primo, o qual não deixava de botar uma bola de basquete, vimos como esta foi engolida pela pequena fenda entre a caixa e a porta. Mas essa é outra história...
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