quarta-feira, 5 de setembro de 2012

nº 144 Uma inscrição em São Pedro de Vilas.

Na postagem número 116 deste blogue fazia um pequena reportagem da minha visita a São Pedro de Vilas, um lugar extraordinário na paroquia de Assados, tanto pela sua beleza como pelas muitas incógnitas que guardam os seus muros. Nessa postagem apresentava as fotografias duma inscrição situada na fachada, a qual fica um bocadinho dissimulada por outra mais monumental e centrada no lenço, que alem disso, está repassada em cor preta.
A inscrição pequena, por chama-la de algum modo, tinha uma leitura dificultosíssima, chegando mesmo a pensar na impossibilidade de saber que seria o que lá havia escrito. Mas para procurar um mínimo ordem lógico no meu relato, vou começar por dar a minha versão do que considero põe a que chamaremos inscrição grande.




GLORIOSA RECORDon[acion]
DE N[uestro] S[antísimo] P[adre] CLEM[ente] 9º P[ontífice] Maxº[imo]
REYNANDO CARLOS II N[uestro] S[eñor] Q[ue] D[ios] Gº[uarde] SIE[n]
D[o] AR[zo]B[is]PO DE [la] S[anta] EI[glesia] [de] S[antiago] D[on] ANDRES XIRº[on]
HIZO FABRICAR ESTA CAPILLA GONZ[alo] DE S[antiago] TORRADO
EXECUTAN[do] LA ULTIMA VOLUNTº[ad]  C[o]N Q[ue] MU
RIO EL Lº[icenciado] P[edro] DE S[antiago] TORRAD[O] S[u] HERMº[ano] Rº[everendo] DE YSORN[a]
ANO DE 1671

«Gloriosa recordación de Nuestro Santísimo Padre Clemente Noveno Pontífice Máximo, reinando Carlos II, Nuestro Señor que Dios guarde, siendo arzobispo de la Santa Iglesia de Santiago Don Andrés Girón, hizo fabricar esta capilla Gonzalo de Santiago Torrado, ejecutando la última voluntad con que murio el Licenciado Pedro de Santiago Torrado, su hermano reverendo de Isorna. Año de 1671.»

O texto gravado na fachada de São Pedro de Vilas dá muita informação do contexto histórico no que se fez a obra. Tem uma linguagem protocolária que aos não peritos nisto da epigrafia nos resulta complexa á vez que sedutora. Começa falando do Papa Clemente IX, morto em 1669, só dois anos antes da construção da capela, por isso a fórmula de início Gloriosa Recordação. Depois, nomeia-se ao rei Carlos II, último dos Habsburgos, que reinou entre 1661 e 1700 e ao arcebispo compostelano Andrés Girón, que o foi desde o 1670 até o 1681. Aparecem a continuação os nomes de Gonzalo e Pedro de Santiago Torrado, este último padre na paróquia de Isorna. Sobre estes dois irmãos e a sua implicação na construção da capela transcrevo os dados achegados por Xosé Comoxo e Xesus Santos no imprescindível A heráldica nas terras de Rianxo, Braxóns e linaxes.

«Don Pedro de Santiago Torrado, crego de Santa María de Isorna, deixou ordenado no testamento, feito o 7-4-1670 perante o escribán de Cordeiro Don Antonio Sánchez, que o seu sucesor edificase unha capela dedicada a San Pedro e a Nosa Señora de Guadalupe [...].
Cumprindo coa súa obriga o sucesor Don Gonzalo de Santiago Torrado, irmán de Don Pedro e veciño nese momento de Corrubedo, "executando la última voluntad con que murió el Licenciado Don Pedro de Santiago Torrado", púxolle mans á obra. O lugar elixido para levanta-lo edificio foron uns terreos irregulares, non moi apropiados "por causa de los ganados que bienen de los montes y corrales de los vezinos del lugar", que traballaba o caseiro do testador, chamado Alberte Costas, xusto "al salir de la congostra contigua del lugar, arriba en el alto, puesta a orillas de la del medio entre cuatro piedras que demarcan las dos lindantes al norte y la fachada de trabassia". [...]
Así se cumpriu un ano máis tarde. O encargado da obra foi o mestre canteiro e veciño de Rianxo, Gregorio de Somoza. En 1672 xa se celebrou misa nela».

A inscrição pequena, dissimulada ante a monumentalidade da grande é muito mais complicada de ler.



Fazia tempo que o meu amigo Juan Carlos Collazo Alejandre e mais eu vínhamos elucubrando sobre o possível significado duns caracteres que até semelhavam, vistos desde o adro, de estética hebréia. Obviamente sabíamos que aquele não podia ser um problema sem solução e menos para dois elementos a cada um mais teimudo e cheios desse estímulo primário chamado curiosidade intelectual. Assim que tornamos ao lugar, isso sim, esta vez providos de escada e giz -desculpem os científicos canónicos- com o firme propósito de botar o tempo necessário até resolver o significado de tais signos caligráficos. 
A surpresa, mais para o Carlos que olhava desde abaixo que para mim, usuário do giz, foi que a medida que repassávamos as letras o texto ia aparecendo clarinho, primeiro palavras soltas e depois a frase completa. Eis o resultado da nossa pintada:


que aqui la mando fundar dex
indo le por P[]ron de ella.

Na minha mais absoluta ignorância e a primeira vista, o texto pareceu-me um fragmento de outro maior. Na segunda linha, no centro da frase, há uma furado rectangular que faz com que a uma palavra lhe faltem letras. A minha interpretação do texto é a seguinte: «que aqui la mando fundar dexindo le por Patron de ella».
Qual é a razão da existência desta segunda inscrição? O nosso amigo do blogue de referência Flor na Area sugere-nos que ambas podam ser complementares, é dizer, que primeiro se encomendara a inscrição grande e depois se acordara acrescentar o texto com duas linhas mais em honor ao patrão. Eu considero que esta é a hipótese mais provável. O certo é que o estilo de escritura é totalmente diferente: a grande com letras maiúsculas e abreviaturas e a pequena com minúsculas e a texto corrido.

Quando baixei da escada e vi o epígrafe desde o adro tenho que dizer que experimentei uma grande alegria de termos resolvido uma curiosidade intelectual que já quase dava por irresolúvel. Porém, São Pedro de Vilas continua a ser um grande enigma em si mesmo. O estilo arcaizante da construção, os motivos ornamentais dentro e fora do templo com cabeças cortadas, grifões ou serpes animam a especulação. A sua romaria é um rito que pouco tem de cristiano e muito de adoração à natureza. E o seu entorno... Bom, disso melhor nem falar.

sábado, 1 de setembro de 2012

nº 143 Graffiteiros do passado IV

IV

O Campo das Graneiras de Meiquiz é um lugar extraordinário, não só pelo seu valor etnográfico e estético intrínseco, senão pelo grande potencial que tem como espaço singular para a celebração de eventos ou actividades didácticas relacionadas com o conhecimento das graneiras, as suas variedades e os seus usos.
Desde um espaço amplo, onde devia estar a eira de malhar, podes contemplar os espigueiros, caboços, graneiras, piornos, hórreos, que de todas estas formas, e alguma mais, se lhes denomina, com a curiosidade de que praticamente todos espécimes que contemplamos pertencem a um género de graneira diferente, estando alguns feitos de madeira, outros de pedra, outros mistos, também de tijolo, havendo-os com cepa, com claros... em fim, um parque temático do hórreo galego.
Para mim é uma matéria pendente saber mais deste Campo das Graneiras, e quiçá no curso que começa me aplique com especial atenção. Hoje quero deixar constância no meu blogue dum descobrimento para mim inquietante, como cada vez que me encontro com um destes graffitis do passado, difícil de interpretar, mas tão doado, ao mesmo tempo, de especular sobre o seu significado!
O gravado está sobre uma pedra nos limites do Campo das Graneiras de Meiquiz. A pedra deveu pertencer a uma construção agora desmontada, quiçá um hórreo? De momento nada sei, e tal vez nunca saibamos a sua colocação certa, mas sim podemos desfrutar da sua beleza esquemática e comparti-la por se alguém pudera dar alguma dica a seguir.
Trata-se dum desenho inscrito num quadrado de lados que pretendem ser iguais, duns 30 cm de comprimento. No interior há uma cruz truncada pela parte superior e cujo haste inferior, sempre na direcção da fotografia, está sobre um pedestal em forma de «m». No canto inferior esquerdo há um ponto e no lado direito um arco em forma de com um apêndice no centro semelhante a um mamilo.
Poderíamos qualificar este desenho como uma marca de propriedade ou uma marca de canteiro, mas ambas as duas hipóteses como mera sugestão, pois como digo, careço de qualquer informação adicional.


Por último, sobre tudo a um possível leitor de Ilha de Orjais indígena de Meiquiz ou de Or, qualquer informação sobre a pedra será de agradecer. 

sábado, 18 de agosto de 2012

nº 142 2666. Roberto Bolaño e Rafael Dieste.

HISTÓRIAS E INVENÇÕES SOBRE 2666, ROBERTO BOLAÑO E RAFAEL DIESTE

Ao  meu amigo Ramão Pinheiro "Chito",
guru da dinâmica de redes,
que provocou o encontro na Ilha de Orjais
entre a pena de Bolaño e o violino de Granell.
JUSTIFICAÇÃO

Faz algo mais de um ano viu jantar à nossa casa o meu amigo Ramão Pinheiro “Chito”. Com ele trouxe a um colega do seu trabalho, admirador do escritor chileno Roberto Bolaño. Foi ele o primeiro em falar-me da presença de Rafael Dieste no romance 2666, publicado por vez primeira em 2004. Desde então tomei como objetivo próximo a sua leitura, que se veio demorando no tempo por muitas outras leituras urgentes, nem sempre desejadas. Foi este verão que cometi o erro de comprar o romance de Bolaño, pois me cativou de tal modo que os meus projectos intelectuais estivais ficaram de jeito irremediável em segundo plano.
O único livro que eu lera de Roberto Bolaño com anterioridade a 2666 fora Putas asesinas, uma coleção de contos que, além de mais, foi o meu primeiro contacto com um leitor de livros digitais. Depois comprei em papel os contos completos, Cuentos, da editorial Anagrama, do que falarei mais adiante.
A finalidade desta postagem é a de sugerir uma leitura da obra de Roberto Bolaño em código Dieste, partindo de elementos evidentes, dados indiscutiveis para irmos achegando-nos a outros indemonstraveis,  expostos a modo de hipótese lógica. Fique claro que só é a opinião dum leitor apaixonado por 2666, uma obra que faz parte já da minha biblioteca ideal. Gosto das matemáticas, como da filosofia, como de tantas outras disciplinas das que careço da formação básica, mas às que constantemente me aproximo desde a curiosidade intelectual e o amor pela cultura. Entenda-se este trabalhinho, pois, como o exercício literário dum leitor diestino da obra do chileno Roberto Bolaño.

AMALFITANO E O TESTAMENTO GEOMÉTRICO.

Em 2666 aparece a palavra Dieste em 30 ocasiões, concretamente nas páginas: 176, 239, 240, 241, 242, 243, 244, 245, 246, 250, 251, 252, 254, 264, 265, 266, 270, 285, 286, 287. 
Obviamente, este dado que acabo de transcrever não serve tão só para pôr em evidencia o meu freakismo documentalista, senão que também nos permite visualizar a concentração da palavra Dieste num espaço limitado do livro, quase exclusivamente no segundo capítulo titulado La parte de Amalfitano, pp. 209-291. Fora destas páginas há alguma referencia mais ao Testamento Geométrico, e mesmo a alguma outra obra de Dieste, como veremos mais adiante, isso sim, menos clara ou mais subtil. 

«Esa noche, al volver a casa, salió al patio y vio a su padre hablando con el libro que desde hacía tempo colgaba del cordel de la ropa en el patio trasero». p. 419

Por tanto, Dieste e o seu tratado tem um grande protagonismo na parte de Amalfitano, e aguardo poder demonstrar que também no resto do livro.
A presença do Testamento Geométrico na trama do segundo capítulo começa quando o professor chileno Amalfinato, o qual vivera na Catalunha, encontra o ensaio de Dieste junto com outros livros no interior duma caixa. Sem conseguir lembrar como aquele livro chegara a lhe pertencer, decide pendura-lo com umas pinças na corda da roupa, a imitação do único ready-made que Duchamps fizera na sua estadia em Buenos Aires.
Como é sabido, um ready-made é um objeto sacado do seu contexto original, ao que se lhe dá outra função da que lhe é própria e convertido em arte. Duchamps chamou a esta obra Le ready-made mallheureux e foi concebido como um presente de boda para a sua irmã Suzanne.

 «Calvin Tomkins escribe al respecto: Con motivo de la boda de su hermana Suzanne con su íntimo amigo Jean Crotti, que se casaron en París el 14 de abril de 1919, Duchamp mandó por correo un regalo a la pareja. Se trataba de unas instrucciones para colgar un tratado de geometría de la ventana de su apartamento y fijarlo con cordel, para que el viento pudiera “hojear el libro, escoger los problemas, pasar las páginas y arrancarlas. […]
En los últimos años, Duchamp confesó a un entrevistador que había disfrutado desacreditando “la seriedad de un libro cargado de principios” como aquél y hasta insinuó a otro periodista que, al exponerlo a las inclemencias del tiempo, “el tratado había captado por fin cuatro cosas de la vida». p. 246

Pode parecer que a introdução do Testamento Geométrico de Dieste na trama do romance é apenas ilustrar mais uma excentricidade do Amalfitano, um professor universitário com brotes esquizoides. Mas não é assim. Desde um primeiro momento, Bolaño quer dotar de protagonismo ao livro, deixando claro que não é um título escolhido ao chou entre tantos outros que se poderiam acomodar ao modelo de Duchamp. Bolaño está na pose dum exemplar do Testamento Geométrico que descreve minuciosamente, quiçá com o fim último de que não fique a menor dúvida da sua pertinência.
Isto acontece, por exemplo, na página 239, na que Bolaño descreve as páginas 4 e 5 do livro de Dieste. 


Irónico, como só o escritor chileno sabia sê-lo, diz: «A Amalfitano le pareció, por lo menos, una costumbre extraña el poner los apellidos de los amigos en mayúscula, mientras el apellido del homenajeado estaba en minúscula». p. 239-240

Na página 241, Bolaño chega mesmo a transcrever o contido da etiqueta da loja na que foi comprado o Testamento geométrico, a livraria Follas Novas. Todos os dados da etiqueta que aparecem no livro são certos. Como curiosidade, mais uma vez o freaky que levo dentro, o livro deveu ser comprado no intervalo de tempo que transcorreu entre que as etiquetas de Folhas Novas incluíram os prefixos e quando posteriormente acrescentaram o correio electrónico.


Mas até onde chega a importância de Dieste em 2666? Há que a circunscrever só a este capítulo ou podemos sugerir outros pontos de contacto?

2666. SOBRE O TÍTULO E OUTRAS CASUALIDADES.

O título do livro de Bolaño, além de uma complicação para bibliotecários catalogadores, é uma cifra enigmática, que com esse 666 demoníaco tão explícito, imediatamente nos anuncia que algo mau vai passar. Devemos ter em conta que a marca da besta não é uma data, senão o nome cabalístico duma pessoa. Quiçá esse 2000 + 666 represente o instante da nossa era em que o assassino, o femenicida reina ao seu antolho.
Ignacio Echevarria assinala como a cifra 2666 já aparecia no relato Amuleto (1999): 

«[...] pero no a un cementerio de 1974, ni a un cementerio de 1968, ni a un cementerio de 1975, sino a un cementerio de 2666, un cementerio olvidado debajo de un párpado muerto o nonato, las acuosidades desapasionadas de un ojo que por querer olvidar algo ha terminado por olvidarlo todo (pp. 76-77)». p. 1124

Já tenho dito muitas vezes, esta frase vai me acompanhar de por vida, que as casualidades são os milagres dos ateus. É casualidade que Dieste tenha um relato cujo título é uma data do futuro? Certamente em Dos arquivos do trasno, inclui um relato titulado Once mil novecentos vinteseis, [11926]. Trata sobre um catatónico que permanece neste estado onze mil anos para acordar num tempo futuro onde presença como um homem velho e outro em idade infantil comem o corpo esquartejado dum ser da sua mesma espécie.

«Dunha banda o home degradado e da outra o mar de sempre». p. 73

Não espantaria que Bolaño conhecesse e mesmo admirara Dos arquivos do trasno. Dieste é um escritor conhecido em hispanoamérica, sobre tudo após a publicação em Buenos Aires de Historia e invenciones de Félix Muriel, Editorial Nova, 1943, que vai resultar, junto com Ficciones, de Borges, o despegue na literatura hispana do chamado realismo mágico.
Entre as páginas 884 e 921 de 2666 entrelaçam-se as biografias de dois escritores de ficção: Boris Abramovich Ansky e Efraim Ivanov. Desde a minha fixação diestina encontro várias “casualidades” que passo a comentar:

«Un día le pidieron un relato cuyo tema debía versar sobre la vida en Rusia en el año 1940. En tres horas Ivanov escribió su primer cuento de ciencia ficción». p. 889

Que grande a fina ironia de Bolaño! Este relato, El tren de los Urales, tem com protagonista a um velho, um menino e um comboio, as mesmas personagens de O velho que queria ver o tren de Dos arquivos do trasno. Mais adiante, Ansky, fundador do Teatro de las Vozes Imaginarias, publica um livro de aforismos; curioso que Dieste publique um titulado ¿Que es un axioma?. O livro de Ansky leva o título de Consideraciones sobre la muerte de Eugenia Bosch. Também curioso que em Dos arquivos do trasno haja um relato titulado, por sua vez, Sobre da morte de Bieito.

Por último uma outra casualidade exo-2666. Uma das características mais salientáveis de Dos arquivos do trasno é que desde a sua primeira edição sempre contou com um limiar, titulado assim, onde Dieste define o conto a través de seis pontos a modo de axiomas.

«A singularidade de Dos arquivos do trasno vese reforzada pola poética do relato coa que a xeito de “limiar” o autor preludiou desde 1926 todas as edicións da obra. Os seus seis aforismos posúen o valor de auténticos axiomas no que teñen de definición e postulación, no seu trazado de regras fundamentais do xogo». CASAS, Arturo Rafael Dieste e a sua obra literaria en galego. p. 127

Em 1997 aparece Cuentos, que reúne os livros de contos de Bolaño, Llamadas telefónicas, Putas asesinas e El gaúcho insufrible. Este volume está precedido dum breve, e genial, prólogo titulado “Prólogo: Consejos sobre el arte de escribir cuentos”.

2666 E O TESTAMENTO GEOMÉTRICO.

Chegados a este ponto tenho que dizer, mais uma vez, que eu não creio que a presença do Testamento Geométrico seja só uma justificação para introduzir a Duchamp ou dotar dum novo rasgo ao complexo perfil psicológico de Amalfitano. O Testamento Geométrico é algo assim como um manual de uso para a leitura de 2666 ou uns planos para compreender a arquitectura da novela rio de Bolaño.
Os cinco capítulos de 2666 são como cinco retas paralelas cruzadas por outras retas que põe em contacto realidades que acontecem em espaços e tempos diferentes. Bolaño anunciava isto quando faz que o professor Amalfitano desenhe, quase que com escritura automática, triângulos, retângulos, hexágonos, paralelas, secantes, etc. junto com nomes ilustres aparentemente inconexos.

«El dibujo 4 resultaba curioso. Trendelenburg, hacía muchos años que no pensaba en él. Adolf Trendelenburg. ¿Por qué justo ahora y por qué en compañía de Bergson y Heidegger y Nietzsche y Spengler?». p. 249

Estes desenhos lembram às demonstrações do Testamento Geométrico, mas também nos invitam a reflexionar sobre a estrutura de 2666. Ignacio Echevarria comenta o carácter “têxtil” do romance de Bolaño: 

«Tras la lectura del texto, sin embargo, parece preferible retomar la novela en su conjunto. Aunque toleran una lectura independiente, las cinco parte que integran 2666, aparte los muchos elementos que comparten (un tejido sutil de motivos recurrentes), participan inequívocamente de un designio común». p. 1122

Desenhos de 2666:


Desenhos de Testamento geométrico:



Resulta doado trazer conexões a modo de diagrama no qual várias retas paralelas A, B, C, D, E, capítulos de 2666, são cortadas por outra reta, F, que pode ser uma personagem, um objeto... Os lugares nos que as linhas se tocam, x, y, etc. seriam os instantes dos capítulos onde essa personagem, essa situação, esse objeto comum está presente.

Mas as cinco retas, os cinco capítulos que conformam o romance de Bolaño, não só têm histórias e personagens que se inter-relacionam, senão que compartem um ponto de fuga comum: 2666. Ao mundo tridimensional dos objetos, incorporamos uma nova dimensão, a direção no espaço, o movimento. Todo isto está em Riemann/Dieste; todo isto é incorporado por Bolaño.

«La cuarta dimensión, decía, contiene a las tres dimensiones y les adjudica, de paso, su valor real, es decir anula la dictadura de las tres dimensiones, y anula, por lo tanto, el mundo tridimensional que conocemos y en el que vivimos. La cuarta dimensión, decía, es la riqueza absoluta de los sentidos y del Espíritu (con mayúscula), es el ojo (con mayúscula), es decir el Ojo, que se abre y anula los ojos, que comparados con el Ojo son apenas unos pobres orificios de fango, fijos en la contemplación o en la ecuación nacimiento-aprendizaje-trabajo-muerte, mientras el Ojo se remonta por el río de la filosofía, por el río de la existencia, por el río (rápido) del destino.
La cuarta dimensión, decía, sólo era expresable mediante la música. Bach, Mozart, Beethoven». p. 830

Na física, a quarta dimensão é o tempo, e quem melhor para falar sobre isto que o domador do tempo, um regente de orquestra.
Curioso, mais uma vez, que o escritor e matemático rianjeiro fora também músico, pianista, para ser mais exato. O grande pintor Granell, também músico, violinista, comentava que durante a estadia de Rafael Dieste em Barcelona, em plena guerra civil espanhola «frecuentaba a casa de Eduardo [irmão de Rafael], sua muller, Mirca, e sua filla Mireya. Xantaba con eles e pola tarde, con Mireya, excelente pianista, tocabamos sonatas de Beethoven e Mozart, e sobretodo composicións de Xoán Sebastián Bach, que era o compositor máis admirado por dita família». p. 55

2666 é, pois, uma longa viagem no espaço-tempo, que só pode produzir um movimento cara a frente, cara a essa data final ou esse lugar ao que estamos predestinados a ir. Mas nesse movimento há lugar para as ilusões óticas, dado que na vida, na realidade, as coisas não sempre são o que parecem. A parte em que Amalfitano conversa com Charly Cruz sobre o funcionamento do traumatropo, pp. 421-422, é, em si mesma, uma pequena obra de arte. 

Não podia ser outro o nom de plume de Hans Reuter porque nada mais parecido a um quadro de Giuseppe Arcimboldo (1527-1593) que 2666. Cada capítulo é um objeto singular, independente, mas unidos, o resultado é um todo completamente diferente. Se eu fosse editor da novela de Bolaño, ilustraria a capa com o óleo do pintor milanês O bibliotecário.



Gostaria de transcrever agora as Noções Comuns dos Elementos euclidianos tal como são apresentados no Testamento geométrico:

«1) Cosas iguales a una misma cosa son iguales entre sí.
2) Y si a cosas iguales se agregan cosas iguales, los todos (sumas) son iguales.
3) Y si de cosas iguales se quitan cosas iguales, los restos son iguales.
4) Y las cosas coincidentes son iguales entre sí. (O, según otra versión: Cosas que pueden hacerse coincidir – superponerse una a la otra – son iguales entre sí).
5) Y el todo es mayor que la parte.» p. 89

Faria falha o espaço duma tese de doutoramento para explicar porque o penso, mas desde a minha mais a-científica intuição estou certo que Bolaño teve presente as Noções Comuns de Euclides na construção de 2666. Quiçá estes cinco axiomas sejam a justificação da inclusão de Dieste, mesmo para areja-los, para que apreendam como é a vida real, a vida em movimento. A coisas iguais agregar coisas iguais, fazê-las coincidir, sobrepor, o todo é maior que a parte...
O soldado Hans Reiter, o jardineiro de Veneza, o escritor Benno Von Archimboldi e o velhote desorientado sentado na cama dum hotel de Santa Teresa, são,  realmente, a mesma pessoa? O Testamento geométrico é o mesmo objeto quando o pendura duma corda Amalfitano p. 245, quando o observa Rosa p. 246, quando Fate o toca com as polpas p. 431 ou quando Espinoza pergunta a Amalfitano por ele p. 176? Por certo, nenhuma metáfora melhor sobre o livre movimento que a viagem do Testamento geométrico no interior duma caixa, sem que o professor chileno saiba quando o comprou, quem o introduziu no interior da caixa, como chegou um livro assim a pertencer-lhe. Mais uma vez, um Bolaño brilhantíssimo.

Agora, uma prova de agudeza intelectual. O texto a seguir procede de 2666 ou do Testamento geométrico?

«Por lo demás el discurso humano no ha proceddo por hiladas, como en la erección de un muro, primero esto y sobre esto lo otro; y ello, lejos de constituir un desorden, desorden «primitivo», es más bien un signo de natural cordura, la más fundante y originaria, pues hay nociones que, inexcuxablemente, se hallan presente y funcionan con esencial pureza en lo uno y lo otro. » p. 94

CONCLUSÃO

Todos somos conhecedores da enorme erudição de Roberto Bolaño. Se sobre literatura sabia quanto é possível saber, sobre o conto, certamente, sabia ainda mais. Nessa vasta sabedoria tinha de haver um lugar para Dos arquivos do trasno, Historias e invenciones de Félix Muriel e quem sabe quantos títulos mais de Dieste. Gostaria de poder fuçar na biblioteca de Bolaño à procura dos livros do escritor rianjeiro. Estou certo de que os encontraria.
Tal vez, a dia de hoje, haja já investigações encaminhadas, ou mesmo rematadas, sobre a relação Dieste-Bolaño feitas por pessoas com mais vagar, talento e formação do que eu. 2666 é uma obra tão importante que vai gerar debates, polémicas, o concurso dos exegetas mais reputados e das mentes mais preclaras. Pode que nesta orgia intelectual aconteça com Rafael Dieste algo semelhante à interpretação que o velho alugador de máquinas de escrever fiz sobre o acontecido no Calvário:

«-Jesús es la obra maestra. Los ladrones son las obras menores. ¿Por qué están allí? No para realzar la crucifixión, como algunas almas cándidas creen, sino para ocultarla». p. 989

CODA

Considero que a presença de Dieste em 2666 é um acontecimento extraordinário para as letras galegas em geral e para a vila de Rianjo em particular. É por isso que proponho uma celebração titulada Ready-made desgraçado, 2ª parte. 

Instruções: A representar pela companhia Teatro das Vozes Imaginárias.

1. Frente à casa natal de Rafael Dieste instalara-se uma corda onde os participantes poderão pendurar o livro que considerem deve arejar-se a ver se apreende três ou quatro coisas da vida. Eu já escolhi o meu: a bíblia.
2. Um violinista e uma pianista, caracterizados de Granell e Mireya, interpretaram uma partitura de Bach.
3. Algum vulto da cultura local lerá 11029 e O neno suicida, relatos de ciência-ficção de Rafael Dieste.
4. Remataremos o ato pensando no triângulo equilátero cujos vértices são Duchamp, Bolaño e Dieste. 

AMEM

As edições por mim utilizadas de 2666 e Textamento geométrico são:

BOLAÑO, Roberto 2666 Anagrama, colección compactos. 8ª ed 2012

DIESTE, Rafael Testamento geométrico Ed. del Castro. 1ª ed 1975

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

nº 141 Novidades da egoteca.

Sempre é uma alegria ver como livros teus ou nos que ti participas saem ao mercado e podes compartilha-los com o pessoal. Ultimamente apareceram dois que acho ficaram muito bem, e que são desde já um produto muito recomendável para as pessoas que amem a música e a poesia a partes iguais.
Com a editorial Xeriais, acabo de colaborar como músico na edição de O meu primeiro Celso Emilio. Na realidade, com quem colaborei foi com os seus autores, Xosé Lastra Muruais e a sua filha Xiana Lastra Pernas. Nem que dizer que a estas alturas da minha vida só colaboro naquelas coisas que cumprem as minhas expectativas ideológicas, culturais, artísticas... Mas se quem liga é a família Lastra Pernas, estou pronto mesmo para invadir Polónia. 
Na parte musical, grandes arranjos de Xurxo Varela e Nani García. Nas vozes María Manuela, Mini e Mero, Xiana Lastra e meu irmão Manolo Dopico. Nos instrumentos Roberto Grandal, Nuria Lestegás, Simón García, Juanma Varela Louro, Xavier Ferreiro e mais eu, além do Xurxo e do Nani.

Eis o link do facebook.

Junto com Isabel Rei e Joam Trilho, vimos de editar A música de seis poemas universais de Ernesto Guerra da Cal. O título é uma espécie de imitação dos Seis poemas galegos de Lorca, nos que o poeta ferrolano teve tanto a ver. Nós, agrupamos numa edição única as composições dispersas ou mesmo inéditas que sobre poemas de Guerra da Cal pudemos localizar. Obviamente não foi doado, mesmo nalgum caso houve que fazer numerosíssimas gestões para lograr consultar os originais, mas ao final logramos o nosso cometido e acho que ficou um livro útil, belo e dum grande valor histórico.
Nem que dizer que para mim foi um honor e um grande prazer compartilhar este trabalho com o grande mestre Joam Trilho, do que tanto apreendi, sobre tudo a fazer as coisas bem. O mesmo com a minha irmã nas lutas culturais Isabel Rei, tão comprometida como eficaz, nem sempre qualidades que vão à junta. 
Bom, se a isto sumamos os Cantos Lusófonos... pois isso, um ano de esplêndidas colheitas.


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

segunda-feira, 23 de julho de 2012

nº 139 A sanfona de J. M. Pintos e uma ilustração de Francisco Herrera.

Quando dava aulas no Conservatório de Música Tradicional e Folque de Lalim, trabalhei com meus/minhas alun@s o famoso texto de J. M. Pintos, dado a conhecer por Casto Sampedro, no que se recolhe um pequeno catálogo de vocábulos referentes às partes da sanfona. O léxico do Pintos resulta muito valiosa, por quanto além de lexicógrafo era músico, violinista, sendo uma voz, por tanto, muito acreditada.

Estes termos não vêm acompanhadas das respectivas definições que o Casto Sampedro considerava óbvias e eu não tanto. Por mais que procurei o original utilizado pelo antiquário pontevedrês, não dei com ele, nem sei se ainda existe. Num intento de criar a polémica necessária que nos leve ao conhecimento do significado real de cada item proponho as que seguem, fruto mais da intuição que de qualquer método científico.

Convido-vos a que participeis com as vossas sugestões.

ASAS ALZAS: Alça é sinónimo de presilha como a que serve para passar o cinturão nas calças em redor da cintura. Asas são a parte pela que se pega nalguns utensílios, assim que asas alças, acho que fez referência aos apêndices da sanfona as que se amarra a correia ou correão.

BORDÓN: Bordão: "Corda grossa que nalguns instrumentos musicais, produz sons graves" (P.E.) Em Coromines podemos ler: 1463, "del fr. Faux-bourdon id., compuesto de faux "falso" y bourdon tono bajo en ciertos instumentos musicales, propte. Abejorro, zángano (por el zumbido de estos insectos), voz onomatopéyica. Origen parecido tiene bordona "cuerda de la guitarra". Nas sanfonas em G fundamental do teclado produziria um som contínuo em C.

BORDONETA OU QUINTILLA: O sufixo -eta provem do latim -itta, vivo em palavras como pandeireta. Com tudo hoje está em uso bordoncinho. Esta corda fez uma quinta do bordão, origem da segunda acepção. Quintilha, usa-se para a forma poética de cinco versos, pelo que de empregar esta acepção e por correspondência com prima e terceira preferimos quinta.

CAIXONCIÑO OU SECRETIÑA: Compartimento pequeno situado na parte que toca ao músico entre o cravelhame e a tampa traseira.

CASTILLETE: Parece referir-se ao compartimento provido de tampa com dobradiças que protegem as cordas desde o cravelhame até a roda, cujas paredes laterais estão furadas transversalmente para ser atravessadas pelos barrotes das teclas. É uma palavra castelhana que significa "s.m. Armazón de materiales y formas diversas que sirve como soporte de algo". Também dim. de castillo. Dado que não é palavra galega pode ser substituída por castelinho ou castelejo. Por similitude preferimos a mais comum estojo.

CHAVE: Esta palavra refere-se entre outras acepções aos pistões de alguns instrumentos de metal que ao preme-los permitem dar a nota desejada. Acho que na sanfona se refere as teclas que para o mesmo fim preme a mão esquerda do executante.

CORDAS: "s.f. Fio de tripa ou de metal para produzir sons em alguns instrumentos" (P.E.)

CORDEEIRO: Pintos (D.D.) no seu dicionário recolhe esta palavra: "Cordelero, tirante en instrumentos de cuerda". A tradução ao castelhano mais correcta seria cordal. Em galego podemos usar a palavra estandarte, que é o nome empregado para o elemento similar na família dos violinos.

CORREDORES: Em quanto que corredor pode ser uma viela estreita ou um carreiro, possa que esta palavra faça referência a o espaço pelo que transitam as cordas entre os tempereiros.

CORREÓN: Correão: "Correia larga e grossa" (P.E.)

CRAVIXAS: Cravelha: "s.f. Peça com que se retesam as cordas de certos instrumentos musicais para afinação" (P.E.)

CRAVIXEIRO: Cravelhame: "s.m. O conjunto das cravelhas; a parte onde estão as cravelhas". (P.E)

ESPECAS: Em (E) Espeque: "s.m. 1º Estaca ou pau com que se estea algunha cousa. 2º Pau que manten erguida a cabezalla do carro." Parece fazer referência as almas e passaria a denominar a estas especificamente na sanfona.

FERRO DO CORDEEIRO: Nos instrumentos de corda friccionada como a sanfona ou o violino, botão ou saliente a que vai fixada por duas finas cordas o estandarte ou cordoeiro e que na sanfona forma parte do veio.

FOLLA DE DIAPASÓN: O diapasão no violino é uma peça, geralmente de ébano, sobre a que dedilha a mão esquerda através da que se pode desenvolver a gama completa da voz do instrumento. Na sanfona o diapasão viria dado pelo tamanho do estojo e o número de teclas que este suportara. Sobre folha lemos em (E): "s.f. (13) Cada unha das palletas, lascas ou partes delgadas en que se divide un todo. (16) Cada unha das partes que se abren e fechan nas portas, xanelas ou biombos." Acho que a folha do diapasão pode ser a tábua do estojo, furada com o fim de que ao seu través passem as chaves.

GARDAPOLVOS: Guarda-pó: Forro de madeira que se põe sobre a roda para a proteger do pó.

PIA: O vocábulo pia é utilizado em náutica como sinónimo de carlinga, " Encaixe na sobrequilha para receber a extremidade do mastro." (P.E.) No caso da sanfona poderia tratar-se dalguma das peças que recebem o eixo, quiçá a entrada a caixa sonora onde se situa o veio.

PONTE: Para a palavra ponte, preferimos a galego-potuguesa cavalete, que é a peça que separa o tampo superior das cordas, transmitindo o som do primeiro ao segundo para que o amplifique. Esta ponte, nas sanfonas clássicas ia sobre uma peça de madeira que impedia que fosse directamente sobre o tampo.
PORTA: Quiçá a tampa do estojo ou castillete.
PRIMAS: As duas cordas cantantes, afinadas ao uníssono e na mesma oitava.

PUNTOS: Pontos, pensamos que podem ser uns ouvidos abertos nos aros da sanfona cujo uso é ainda de difícil interpretação.

RECINA: Resina: "s.f. Producto natural, viscoso, que se extrai de alguns vegetais (especialmente coníferas), de alto valor industrial." (P.E.) A resina utilizada pelos músicos de instrumentos de corda friccionada tira-se do aceite de trementina e serve para oferecer resistência na fruição do arco ou roda sobre a corda.

RODA: Objecto circular, geralmente de nogueira, comunicada através dum eixo metálico ao veio que ao ser accionado fez mover a esta. Tem a função do arco nos instrumentos da família do violino.

SEGUNDA PONTE: Acaso um barrotinho de madeira que vai próximo aos primeiros tempereiros e logo da ponte principal.

TAMPO DE DIANTE: Tampo sobre o que vai situado o estojo e o cavalete, e menos próximo ao executante.

TAMPO DE TRAS: Tampo mais próximo ao executante.

VEO OU AGULLA: A agulha é o objecto metálico que usamos para coser e parece fazer referência ao eixo. Veio e a manivela com a que transmitimos movimento à roda, através do eixo.

TECLAS OU TÉCOLAS: "s.m. Peças de madeira sobre as que se pulsa para que os tempereiros cheguem a encurtar a corda."

TEMPEREIROS: Cada uma das pecinhas de madeira que a forma de tangente pulsam a corda, encurtando a longitude da mesma a diferentes alturas.

TERCEIRA: Corda cantante que acompanha às primas, em uníssono com esta na oitava inferior.

ZAPATILLA: Sapatilha: Camurça de alguns instrumentos de vento para que nas chaves não escape o sopro. É de supor que na sanfona servira para aperfeiçoar o som no roce dos tempereiros com as cordas, podendo ser neste caso de borracha.

(D.D.) 2003 SANTAMARINA, ANTÓN ed. Dicionario dos dicionários.
(P.E): 1990 Dicionário da Língua Portuguesa. (Porto; Porto Editora).
(E): 1995 ALONSO ESTRAVIS, ISAAC Dicionário Sotelo Blanco da língua galega. (Compostela; Sotelo Blanco)

Outro tema, que deixarei para mais adiante, é o do vocábulo veio: manivela com a que se acciona a roda da sanfona. Dará para muito.

Por último, e como ilustração a este artigo, uma reprodução dum quadro de Francisco Herrera (Sevilha, c. 1590 - Madrid, c. 1656).


É uma das representações de cego com lazarilho menos conhecidas das pintadas por artistas da península Ibérica. Pertence ao Kunsthistorisches Museum Wien, que achega a data  de c.1640. Ficha.
O que resulta mais curioso e o próprio instrumento. Parece ter um teclado diatónico e as cravelhas dispostas na parte superior do cravelhame, e não lateralmente como na sanfona ibérica. As ilhargas tendem a ser rectas, com uma pequena curvatura muito afastada da sanfona em forma de guitarra. Eu diria que é um instrumento muito semelhante ao do cego de La Tour, que foi pintado só uns trinta anos antes que o de Herrera. Também é de destacar os pregos cravados na tampa e a postura tão sanfonística das mãos do músico.
Uma beleza.

Para mais referências iconográficas da sanfona ver neste blogue a etiqueta sanfona e a nossa revista digital Opúsculos das Artes.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

nº 138 Oximoro


Oximoro

Sou a parte do teu corpo que passa frio
quando te deitas ao meu lado.
©rjais