Estátua de Francesc Ferrer i Guàrdia
Um dos primeiros monumentos da cidade de Bruxelas mencionados por Castelao é a estátua erguida ao pedagogo Francesc Ferrer i Guàrdia (1859-1909). Este monumento tem uma história curiosa e a citação do artista Rianxeiro merece algum comentário.
Mas vamos por partes. O homenageado é o pedagogo Ferrer i Guardia, criador da Escola Moderna, centro educacional de curta duração e com pouco alunado (1901-1906). Apesar de tudo, talvez por ter uma imprensa, uma revista... a sua influência nas gerações futuras foi grande. Lembro-me de ter estudado este pedagogo e esta instituição no Magistério, o mesmo currículo que ignorava a existência da Escola Plurilingue e Jacinta Landa Vaz, ou a obra ensaística do seu marido, Vicente Viqueira.
O facto é que o Estado Espanhol tomou o ilustre pedagogo catalão como bode expiatório dos acontecimentos ocorridos na Semana Trágica de Barcelona. Ferrer i Guàrdia foi baleado no fosso do Castelo de Monjuic em 13 de outubro de 1909, apesar dos fortes protestos internacionais, que exigiam o perdão do rei Alfonso XIII. Como sempre, o Bourbon olhou para o outro lado, concretizando a demissão retórica de Maura, presidente do Governo, que não conseguia acreditar no seu despido.
Após o encerramento da La Escuela Moderna, Ferrer i Guardia viajou para Paris e Bruxelas, período no que funda a Ligue International pour l’Éducation Rationnelle de l’Enfance.
Conhecida a execução do pedagogo catalão, iniciou-se um movimento popular na capital belga pedindo a criação de um monumento a ele dedicado. Este foi inaugurado em 5 de novembro de 1911, sendo os seus autores o escultor Auguste Puttemans e o arquiteto Adolphe Puissant, ambos franc-maçons, como Ferrer i Guàrdia. Na realidade, a construção deste monumento tem muito a ver com a fraternidade maçónica internacional, sendo dedicado aos mártires da liberdade de consciência, como se pode verificar na inscrição original.
A estátua não durou muito, pois durante a Primeira Guerra Mundial, após a entrada do exército alemão em Bruxelas, foi abalada e só foi devolvida ao seu local original em 1919. Nesse lugar, a praça de Sante Catherine, foi onde Castelao contemplou a escultura dedicada a Francesc i Guàrdia.
Sua visão provocou estas poucas, mas interessantes reflexões em Castelão.
«Vin a estatua de Ferrer. É moi interesante como escultura. Unha figura alongada cara o ceo, como se fose do Greco, non pode simbolizar a liberdade de concencia… de Ferrer. Fixeron bem em borrarlle o nome de Ferrer pois non merecía ise moimento. E a libertade de concencia dos avanzados tampouco pode simbolizarse cunha figura que se alonga cara enriba em sentido vertical senón como unha figura que se alonga em sentido horizontal. Os avanzados que viran as costas à gran plaza de Bruselas non podem falar de libertade». Diario 1921 p. 175
Parece evidente a pouca simpatia que Castelao teve com os internacionalistas. No Diário há várias reflexões sobre o arredismo galego, o que passa necessariamente pelo conhecimento de nós e por uma soberania estética que parte do facto diferencial para invadi-lo tudo. Quando Castelao fala de pessoas avançadas, acho que ele coloca no mesmo saco a anarquistas, maçons, esperantistas e qualquer outro utópico que sonhe com uma sociedade global, uma massa internacional de iguais. Castelao estuda a diferença, o folclórico, o artesanal. Se um pintor belga se parece com outro pintor francês ou espanhol, ele despreza-o porque trai a sua tradição. Sem este ensimesmamento cultural, Castelao não teria construído em torno de si o seu universo estético, o universo estético no qual nos vemos refletidos.
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