Sim. É assim de prosaico. Eu teve tratos com o cão dos Dorado, não com o clã. Era um pícaro e passeava pelo Lagartinho, por frente da quinta do Marcial Dorado, aquele homem que conhecíamos de vender as passagens na motora, anos antes de que a ponte acabara com a insularidade da Arousa. Mesmo para umas crianças, embora bem informadas, resultava escandaloso que aquele sujeito chegara a ter semelhante castelo. Dizque a sua moradinha contava com uma grande adega, discoteca particular, piscina e não sei quantas outras esquisitices, ainda mais quando na nossa ilha continuava a haver casas com quinteiro e serviços muito elementares.
Pois bem, eu passava por diante da grande portada e dois cãs de raça loba botaram-se-me acima e deram comigo numa leira contigua, estombalhando-me na erva, mas não por vontade própria. Um dos melhores amigos do homem, que naquela ocasião não o foi meu, deu-me uma chanchada no cu, deixando-me a cacha a ferver.
Cheguei a minha casa assustado e dolorido. A minha mãe decidiu fazer escracho telefónico, pegou no aparelho e pôs a parir a quem estava do outro lado, que por acaso não era o interdito; a saber quem é que era.
Na altura eu tinha doze ou treze anos, agora tenho quarenta e quatro. Botem contas. O Marcial já era um grande empresário, já dera o passo de expendedor de tiques a grande distribuidor de substâncias muito mais lucrativas. Aqueles cativos que fomos atacados pelos cãs dos Dorado sabíamos de quem era a casa, e a que se adicava o patrão. Curioso que um alto funcionário de sanidade não soubesse nada.
Considero que o Marcial Dorado está no cárcere para cumprir condena pela chanchada que um dia me deu no cu o seu cadelo. É um justo pago. O que nunca poderá pagar nem por mais anos que passe de reclusão é a saudade que sentimos dos muitos amigos perdidos. Esse cão dos Dorado, esse sim que é perigoso.
La Vanguardia 19 de dezembro de 1984
(Este Feijoo não deve ser muito de ler jornais)
Que nos van contar verdade? lembro ben os cans. Acontece que ti es de boa memoria. Non todo o mundo pode decir o mesmo.
ResponderEliminarA mim em tudo isto o que mais me doeu foi o silenço do PP da Ria, não só da Arousa. Quantos narcotraficantes, estou a pensar em Oubiña, tinham o carné do partido? Algum desculpa deviam dar, digo eu.
ResponderEliminarPara desculpárense terían que ter conciencia de ter feito algo mal, ou que a presión social o esixise. Creo que non se da nengunha das premisas, cando menos coa intensidade necesaria. Seguimos a ser minoría, de momento!
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